Já defasada, gasolina pode disparar após invasão russa à Ucrânia

Preço internacional pressiona Petrobras a reajustar combustíveis mesmo após lucro recorde. Internamente pressão deve ser por abandonar política de paridade

Vladimir Putin
Foto: Reprodução
Vladimir Putin

O mercado já começou a precificar a invasão russa à Ucrânia . O barril do petróleo atingiu o maior valor desde 2014, com isso, a gasolina, que já está defasada em até 13%, segundo a Abicom (Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis), pode subir ainda mais. 

Os contratos futuros do petróleo Brent, referência no mercado internacional, saltaram mais de 8,42%, cotados a US$ 101,97 . Já o petróleo americano WTI (West Texas Intermediate) é cotado a US$ 100,08, refletindo alta de 8,66%. O Brent e o WTI atingiram seu nível mais alto desde agosto e julho de 2014, respectivamente.

O valor do commoditie disparou após o presidente russo Vladimir Putin ordenar operação militar contra a Ucrânia na madrugada desta quinta-feira (24) .

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Motivos da alta no preço do petróleo

A Rússia é o terceiro maior produtor de petróleo e o segundo maior exportador de petróleo do mundo, além de ser o maior fornecedor de gás natural para a Europa, provendo cerca de 35% do total consumido pelo continente.

Com as sanções econômicas impostas ao país, diminui a oferta dos derivados de petróleo, fazendo os preços subirem. Na terça-feira (22), por exemplo, a Alemanha congelou a certificação do gasoduto russo Nord Stream 2 . Os  Estados Unidos também aplicaram sanções .

"Compradores habituais ficam receosos que se houver uma expansão da guerra vão ter que pagar caro no futuro. Preferem comprar logo agora. Estocar petróleo não é uma má ideia, pois pode ser que falte",explica Emanuel Pessoa, advogado especializado em Direito Econômico Internacional pela Harvard Law School.

O advogado diz que também há a expectativa que a Rússia suba o preço do petróleo por ser uma nação bastante influência politicamente na OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo).

Apesar da recente queda do dólar, freada pela crise no leste europeu , o preço da gasolina tende a aumentar devido à disparada do preço do petróleo no mercado internacional. A defasagem média do diesel está em 8%, e da gasolina em 11%, segundo a Abicom, chegando a 13% em Araucária, no Paraná. 

"Nós sabemos como funciona o Brasil em ano de eleições. A Petrobras talvez seja pressionada a abandonar essa política, ainda mais após a divulgação do balanço recorde. É muito provável que haja interferência na Petrobras para diminuir artificialmente o preço dos combustíveis."

Lucro recorde da Petrobras não deve conter alta dos combustíveis

A Petrobras registrou no ano passado um lucro líquido de R$ 106,668 bilhões . É o maior de sua história e superior ao ganho de R$ 7,10 bilhões obtido no ano passado. Mesmo assim, não deve usar parte do superavit para conter a elevação no preço dos combustíveis. 

O general Joaquim Silva e Luna, presidente da estatal, afirma que o "bem maior" da empresa são os dividendos pagos à União , que devem ser de R$ 37,3 bilhões, além de outros R$ 53,8 bilhões em tributos federais relativos ao ano de 2021.

O próprio presidente Jair Bolsonaro disse ontem (23) que não vai interferir nos preços da estatal . Desde outubro de 2016, a Petrobras adota a política de Preços de Paridade de Importação (PPI), que vincula o preço dos derivados de petróleo ao mercado internacional. Após cinco anos da mudança, o combustível no Brasil concentra a maior alta da história, superando a inflação em mais de 30%.

"Do ponto de vista do aconselhável, quando você passa a intervir numa estatal, você elimina o caráter privado e dá um sinal negativo ao mercado, mostrando que o governo pode mexer em outras empresas, o que pode trazer efeitos negativos duradouros", comenta Pessoa

"O caminho pode ser diferente, ao invés de usar os dividendos, o governo faria menos mal se criasse uma tributação extraordinária sobre lucro de petróleo, o problema é que no Brasil um imposto temporário vira permanente. No fim a população vai acabar pagando. Não existe almoço grátis", adiciona.  

Congresso tenta remediar

O Senado trabalha para implementar a votação de dois projetos que tratam sobre a tributação de combustíveis e sobre a criação de um fundo de estabilização para evitar fortes reajustes da Petrobras. As propostas devem voltar à pauta dos senadores no dia 8 de março.

Governistas tentaram barrar a votação nesta semana para ganhar tempo e negociar os termos propostos pelo senador Jean Paul Prates com o Palácio do Planalto. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, era a favor de votar as matérias na sessão desta quarta, mas após a pressão de parlamentares, concedeu o adiamento da votação .

Os textos são considerados alternativas de urgência para reduzir os preços nas bombas e aliviar a pressão sobre o Palácio do Planalto. Além das propostas, duas PECs estão em tramitação no Congresso Nacional. 

Uma das ideias propostas pelo senador Prates é a criação de um imposto sobre exportação de petróleo, o que, na visão de especialistas, pode trazer ainda mais efeitos negativos a longo prazo. 

"Taxar o nosso petróleo pesado na exportação, você desestimula ele no mercado. Mesmo que ele venha a ser comprado, isso vai ser embutido no preço, esse tributo vai voltar para a população de alguma maneira", explica Pessoa. 




** Luís Felipe Granado é repórter do Brasil Econômico, editoria de Economia do Portal iG, e pesquisador na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)