Paulo Guedes
Reprodução: iG Minas Gerais
Paulo Guedes

Em reunião nesta quinta-feira com empresários e dirigentes de câmaras internacionais de comércio (ICCs) de cerca de cem países, o secretário-geral da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o australiano Mathias Cormann, disse que vê como positivo o possível ingresso do Brasil como membro do organismo internacional. Segundo relato da diretora-executiva da ICC brasileira, Gabriella Dorlhiac, Cormann afirmou que a medida é boa não apenas para o Brasil, “que é um país importante”, mas também para a OCDE.

As empresas brasileiras têm grande interesse no ingresso do Brasil na OCDE. Isso daria uma espécie de ‘selo de qualidade’ ao país, que concorre a uma vaga com Argentina, Peru, Bulgária, Croácia e Romênia. Para o setor produtivo brasileiro, entre as vantagens de entrar para o chamado “clube dos ricos’, uma das principais é o aumento do volume de investimentos estrangeiros.

"Mathias Cormann falou, de forma geral, sobre os desafios da economia global. Um deles é a pandemia da Covid-19. Do lado brasileiro, havia muita curiosidade e expectativa de que ele fosse falar algo específico sobre Brasil, os próximos passos e a visão estratégica da organização", disse Gabriella Dorlhiac.

A OCDE convidou o Brasil e os demais candidatos, há cerca de duas semanas, a iniciarem as negociações para o processo de adesão, o que pode levar de dois a cinco anos, em média. O tema mobiliza não apenas empresas, mas também o governo.

Celeridade e imposto global

Na última quarta-feira, o assunto voltou a ser discutido em uma conversa entre o ministro da Economia, Paulo Guedes, e a secretária a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen. O objetivo de Guedes é fazer com que o Brasil entre na OCDE de forma mais célere.

Conforme O GLOBO antecipou na época, como resultado de uma reunião entre Guedes e Yellen, em outubro do ano passado, o Brasil se aliou aos países desenvolvidos e concordou com uma taxa menor do que defendiam as nações em desenvolvimento, no acordo global que vai permitir o aumento da tributação das multinacionais. Em contrapartida, os americanos disseram que apoiariam mais abertamente a candidatura brasileira.

Meio ambiente, sistema tributário e economia fechada

Fontes do governo e especialistas ouvidos pelo GLOBO avaliam que o Brasil está mais adiantado que os outros cinco candidatos na disputa por uma vaga na OCDE, por ter cumprido cerca de 90% requisitos exigidos para entrar na organização.

Porém, além da preservação da biodiversidade e da redução do desmatamento da floresta amazônica, o país terá de mudar o complexo sistema tributário e abrir seu mercado ao comércio internacional, entre outras tarefas consideradas mais complexas, para atingir seu objetivo.

Autor da carta enviada à OCDE em maio de 2017, em que pediu a adesão do Brasil ao "clube dos ricos", o ex-secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Marcello Estevão, disse que é preciso acabar com os empecilhos que impedem o país de crescer mais.

Estevão, que hoje é diretor global de Macroeconomia do Banco Mundial, citou o sistema tributário brasileiro, “em que o Brasil coleta muito, mas coleta mal”, e a economia ainda bastante fechada para o comércio mundial, “o que é ruim para a produtividade e o consumidor brasileiro”.

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"A receita de impostos no Brasil em relação ao PIB é maior do que em outros países, mas existe uma grande confusão tributária. Além disso, embora não seja algo absolutamente necessário para entrar na OCDE, uma abertura comercial é fundamental para o desenvolvimento de qualquer país", disse Estevão.

Carlos Primo Braga, da Fundação Dom Cabral, destacou que é preciso simplificar os tributos sobre o consumo e o ICMS — em que há diferentes alíquotas cobradas pelos estados. Ele também mencionou a tributação descoordenada no comércio transfronteiriço.

"Há discrepâncias em várias áreas entre as práticas brasileiras e as diretrizes da OCDE, como o tratamento de pagamentos por transferência de tecnologia, mas é no campo político que percepções, diferenças de política comercial e alianças estratégicas vão influenciar o processo de adesão", disse Braga, lembrando que o Brasil chegou a ser considerado um vilão na questão ambiental.

De forma geral, a avaliação é que o processo de negociação será longo para todos os países, podendo levar até sete anos. Mas os benefícios serão gratificantes. Se for autorizado a entrar na organização como membro, o Brasil participará diretamente da elaboração de regras e padrões internacionais para diferentes áreas de atividade econômica e ainda poderá usar as diretrizes da OCDE como referência para a implementação de reformas.

E, com esse 'selo de qualidade de', vai atrair mais investimentos estrangeiros.

"Hoje, existem grandes fundos de pensão que possuem regras internas de que só podem investir em países que estão na OCDE", disse o cientista político Oliver Stuenkel, professor de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas.

Fernando Ribeiro, um dos autores de um estudo divulgado pelo Ipea no mês passado, em que destaca que o Produto Interno Bruto (PIB) per capita brasileiro vai subir com o ingresso na OCDE, disse que as economias se beneficiam, mas os países devem adotar outras medidas que vão além dos compromissos assumidos.

O trabalho do Ipea afirma, entre outras coisas, que a economia brasileira trará indicadores positivos, tal como aconteceu com o Chile que, após entrar na organização, em 2010, que passou a crescer a taxas maiores que a média na América Latina.

"Primeiro, para obter o máximo benefício da acessão os países devem adotar outras medidas, como melhorar a educação, por exemplo, que vão além dos compromissos com a OCDE. Segundo, o tempo entre a adoção de novas políticas e a obtenção dos benefícios varia muito. Alguns efeitos só são sentidos no longo prazo, outros já ocorrem enquanto o país está se preparando para a acessão. Por isso a análise de "antes e depois" feita no estudo não capta perfeitamente os efeitos", afirmou Ribeiro.

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