Desde o início da pandemia de Covid-19, decretada em março de 2020, um novo bilionário surgiu a cada 26 horas. Já os dez homens mais ricos do planeta mais que dobraram suas fortunas, de US$ 700 bilhões para US$ 1,5 trilhão, um crescimento de US$ 15 mil por segundo, ou US$ 1,3 bilhão por dia no mesmo período.
Fazem parte dessa lista Elon Musk, da montadora Tesla, de carros elétricos; Jeff Bezos, da gigante do varejo Amazon; Bernard Arnault & família, um dos controladores do grupo LVMH, com 75 marcas; Bill Gates, da Microsoft; Larry Ellison, da Oracle; Larry Page e Sergey Brin, ambos do Google; Mark Zuckerberg, do Facebook; Steve Ballmer, também da Microsoft; e o megainvestidor Warren Buffet.
A pequena elite mundial de 2.755 bilionários viu sua fortuna crescer mais durante a pandemia do que nos últimos 14 anos.
Na pandemia
Já a renda de 99% da população global caiu, e mais de 160 milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza no mesmo período. A desigualdade de renda contribuiu para a morte de uma pessoa a cada quatro segundos, e estima-se que 17 milhões de pessoas morreram de Covid-19 no mundo, uma escalada de mortes que não era vista desde a Segunda Guerra Mundial.
Os dados foram levantados pela Oxfam, ONG que atua em mais de 90 países na busca de soluções para a pobreza e a desigualdade social. Os dados sobre a desigualdade global foram compilados para embasar as discussões do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça.
O Fórum começaria presencialmente hoje, mas foi adiado por causa do crescimento de infecções pela variante Ômicron. O encontro deverá acontecer no início do verão no Hemisfério Norte, no fim de junho. Ainda assim, hoje haverá um seminário on-line com várias autoridades sobre as preocupações globais mais urgentes.
"Se os dez homens mais ricos do mundo perdessem 99,99% de sua riqueza amanhã, eles continuariam mais ricos do que 99% de todas as pessoas do planeta. Eles têm hoje seis vezes mais riqueza do que os 3,1 bilhões mais pobres do mundo", afirma Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil.
Mais dez bilionários no Brasil
No Brasil, a Oxfam calcula haver atualmente 55 bilionários, com uma riqueza total de US$ 176 bilhões. Desde março de 2020, o país ganhou dez novos bilionários. A riqueza deles cresceu 30% na pandemia, o equivalente a US$ 39,6 bilhões. Os 20 maiores bilionários do país têm mais riqueza (US$ 121 bilhões) do que 128 milhões de brasileiros (cerca de 60% da população).
"No Brasil, também há uma ampla discrepância entre um grupo que prosperou muito exatamente em um momento de crise, em um cenário de desemprego elevado e aumento da fome", diz Jefferson Nascimento, coordenador da área de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil.
Segundo a ONG, a miséria e a fome explodiram no Brasil durante a pandemia. Em dezembro de 2020, 55% da população brasileira se encontravam em situação de insegurança alimentar, o equivalente a 116,8 milhões de pessoas, e 9% se encontravam em situação de fome, ou 19,1 milhões de pessoas. Trata-se de um retrocesso a patamares de 2004.
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No Brasil, a fome afeta mais as mulheres e pessoas negras. A entidade aponta que 11,1% dos lares chefiados por mulheres e 10,7% dos chefiados por pessoas negras estavam passando fome no fim de 2020, frente a 7,7% dos lares chefiados por homens e 7,5% dos lares liderados por pessoas brancas.
"Regredimos 17 anos na questão da insegurança alimentar e fome, e neste momento vemos reduções de políticas públicas nesse sentido. O Bolsa Família, um programa de 2003 e que era reconhecido internacionalmente, foi extinto e substituído pelo Auxílio Brasil, em um ano eleitoral", afirma Nascimento.
O relatório da Oxfam, intitulado “A Desigualdade Mata”, revela que a alta concentração de renda contribui para a morte de pelo menos 21 mil pessoas por dia no mundo. Segundo a entidade, a conta é conservadora e se baseia nas mortes globais provocadas por falta de acesso à saúde pública, violência de gênero, fome e crise climática.
O documento aponta ainda que a pandemia atingiu grupos raciais de maneira desigual. No Brasil, por exemplo, mesmo com o avanço da vacinação, a maior parte das mortes por Covid-19 se concentra nas periferias de grandes cidades. De acordo com Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), pessoas negras no Brasil têm uma vez e meia mais chance de morrer de Covid-19 do que as pessoas brancas.
"As desigualdades têm solução, porque elas são fruto de escolhas políticas. Do jeito que a economia global está estruturada, os mais ricos continuarão se beneficiando e lucrando, enquanto bilhões de pessoas, principalmente mulheres e população negra e de etnias minoritárias, ficarão no final da fila, sujeitas a pobreza extrema, violência e morte", afirma Katia.
A Oxfam defende que os governos “devem reescrever as regras dentro de suas economias que criam essas diferenças colossais, além de agir de modo a pré-distribuir a renda”, afirma o relatório.
Mais tributação sobre os ricos
A ONG também argumenta que os governos deveriam recuperar os ganhos obtidos pelos bilionários durante a pandemia, tributando essa nova riqueza por meio de impostos sobre o capital. Esse dinheiro, diz a Oxfam, deveria ser investido em políticas de saúde pública universal e proteção social, além de adaptação climática e prevenção contra violência de gênero.
Os cálculos da Oxfam têm por base fontes como a lista de bilionários da revista Forbes 2021, o Global Wealth Databook 2021 do Instituto de Pesquisa do Credit Suisse, que trata de dados sobre riqueza, além de dados divulgados pelo Banco Mundial.
A ONG lembra que as desigualdades também têm efeitos sobre as mudanças climáticas globais. Estima-se que as emissões dos 20 bilionários mais ricos do mundo sejam, em média, 8 mil vezes maiores que as emissões de bilhões de pessoas mais pobres. Toda a população global sofre com o aquecimento do planeta, mas os países ricos não conseguem lidar com os efeitos de sua responsabilidade por cerca de 92% de todas as emissões histórica