A decisão do governo de manter parte dos custos com o novo benefício social, o Auxílio Brasil, fora do teto de gastos (crescimento das despesas limitado à inflação, imposto por lei) tem potencial para gerar mais inflação e afugentar investidores, dizem especialistas.
Esses movimentos vêm da percepção da perda de credibilidade da política fiscal. O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nobrega classificou a decisão de deixar o gasto fora do teto como “uma trapalhada administrativa. Para ele, a proposta é uma “barbeiragem” para tentar alavancar a popularidade do presidente Jair Bolsonaro:
"Foi uma barbeiragem. O presidente deve ter pressionado para que o projeto fosse apressado para alavancar sua popularidade e o mercado reagiu mal. Trata-se de um misto de populismo fiscal com trapalhada administrativa. O mercado até melhorou depois que a cerimônia foi cancelada."
Para ele, a medida sinaliza uma piora no quadro fiscal. Na tentativa de buscar espaço fiscal, diz o economista, “vão dar calote nos precatórios, o que é uma violação de contrato e uma vergonha para uma equipe econômica que se diz ultraliberal”.
Ao não respeitar uma das principais âncoras fiscais, o governo mina a confiança do investidor, principalmente a do estrangeiro, que corresponde a 47% dos que investem na Bolsa brasileira, a B3, avalia o economista-chefe da RPS Capital, Gabriel de Barros:
"A impressão que passa é que o Brasil não cumpre nem os contratos que assina consigo mesmo, que é um país com baixa segurança institucional e que pode mudar a regra do jogo a qualquer momento."
Menos empregos
A consequência desse tipo de ação é uma maior aversão a risco, que resulta na desvalorização do real frente ao dólar. Como consequência, os preços sobem, especialmente da gasolina e do diesel, que são atrelados à cotação internacional.
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Ao mesmo tempo, uma percepção de maior risco faz com que os juros futuros subam, reduzindo a capacidade de investimento na economia.
O resultado, aponta Barros, é um ano de 2022 com menos empregos e a população com o poder de compra corroído pela inflação:
"O governo dá com uma mão e tira com a outra, porque a qualidade dessa decisão é economicamente muito ruim. É uma falsa solução, um populismo fiscal com horizonte curto."
O economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating, Alex Agostini, avalia que decisões como bancar parte do futuro Auxílio Brasil com recursos fora do teto de gastos pioram as expectativas sobre o desempenho da economia brasileira. “O descontrole fiscal antecipa um aumento da inflação”.
"A ala técnica do governo, comandada pelo ministro Paulo Guedes, tem como pilar o controle das contas públicas e vinha resistindo. Já a ala política do governo não quer pensar nas consequências econômicas, tem simplesmente como objetivo a reeleição. Isso leva à deterioração das expectativas de crescimento do país", afirma.
Ele diz que o mercado “torceu o nariz” para a proposta do Palácio do Planalto.
"Não existe plano para ter austeridade fiscal, mas sim para o aumento de despesas, independentemente se fica fora do teto."