Três anos após assumir o comando do maior f undo de pensão do país, José Maurício Pereira Coelho anunciou na terça-feira sua renúncia à presidência da Previ, como antecipou o colunista do GLOBO Lauro Jardim. O executivo deixará o posto a partir de 14 de junho .
A mudança na cúpula da fundação é resultado de uma ação dupla. Ela reflete a pressão cada vez maior do Centrão por cargos, o que deflagrou no governo uma operação para abrir vagas para acomodar indicações políticas em instituições como Banco do Brasil (BB) e Caixa e nos conselhos das empresas nas quais esses bancos e fundações têm assento.
Além disso, é um retrato da interferência do presidente Jair Bolsonaro , que teria determinado uma “ limpeza ” para excluir nomes que tivessem qualquer vínculo com governos anteriores.
O Planalto já teria solicitado, inclusive, segundo fontes, uma lista dos indicados para vagas em conselhos onde estatais e fundos ocupam um dos assentos.
Estatuto é trava para indicações
No caso da Previ, a estratégia do Centrão é ganhar cargos com uma espécie de dança das cadeiras que teria início após a saída de José Maurício, o que abriria vagas no BB. A ideia seria deslocar um vice-presidente do BB para a Previ e preencher a vaga com uma indicação política, segundo fontes a par da discussão.
A presidência da Previ, o segundo cargo mais importante do conglomerado BB, desperta a cobiça de políticos. Isso porque é o maior fundo de pensão do Brasil, com R$ 230 bilhões em ativos e um total de 430 mil participantes entre aposentados, pessoal da ativa e dependentes. O fundo tem participações em algumas das principais empresas de capital aberto do país, como Vale, BRF, Itaú, entre outras.
Mas o interesse do Centrão esbarra no estatuto da entidade, que traz cláusulas que buscam reduzir os riscos de interferência política aos quais outros fundos de pensão estão expostos.
Para integrar a diretoria é preciso ser participante da fundação, ou seja, funcionário do banco há pelo menos dez anos. Além disso, é preciso ter experiência em alguma das seguintes áreas: financeira, administrativa, jurídica, contábil ou atuarial. Além disso, metade da diretoria de seis membros é eleita pelos participantes da Previ.
Os outros são indicados pela empresa patrocinadora, o BB. Os diretores de Investimentos e de Participações são sempre indicados pelo BB e os de Planejamento e Administração, eleitos pelos associados.
Um dos nomes cogitados para ocupar cargo no BB é o de Nelson de Souza, ex-presidente da Caixa Econômica Federal no governo de Michel Temer. Ele seria ligado ao senador Ciro Nogueira (PI), presidente do Progressistas (PP). O Centrão estaria de olho ainda na vaga de Ênio Mathias Ferreira, vice-presidente corporativo do BB.
Além disso, é tradição o presidente do BB indicar um vice-presidente da sua confiança para comandar o fundo de pensão dos empregados do banco. Isso só não aconteceu nas últimas duas gestões, de Rubem Novaes e de André Brandão, que optaram por manter José Maurício Coelho na direção da Previ.
Segundo interlocutores, a escolha de um vice-presidente para comandar a Previ também faria parte da estratégia do presidente do BB, Fausto Ribeiro, em buscar apoio em um grupo de executivos de sua confiança para comandar o banco. Ele foi promovido ao cargo pelo presidente Jair Bolsonaro, sem passar por uma vice-presidência.
O anúncio da renúncia de José Maurício foi feito depois dele ter se reunido no último domingo com Ribeiro.
Mudanças também na Funcef
Nos bastidores, Ribeiro fez elogios ao trabalho de José Maurício na direção da Previ. Ele foi indicado ao cargo por Rubem Novaes. O regulamento da Previ prevê que, em caso de ausência do presidente, o diretor de Participações, Denísio Liberato, ocupe interinamente o cargo. Mas o nome dele já circula como possível substituto permanente, de acordo com participantes da Previ.
"Se isso acontecer, será surpreendente. Denísio é um baita profissional, mas ainda está em desenvolvimento. Ainda não é, digamos, um general. Mas tampouco era Fausto Ribeiro. Seu nome não aparecia na Bolsa de apostas", disse um ex-diretor da Previ.
Além da investida cada vez mais forte do Centrão no governo, outro motivo que justifica a saída de José Maurício do comando da Previ seria a ligação dele com Paulo Caffarelli, que o indicou para o cargo. Caffarelli foi secretário-executivo do ex-ministro Guido Mantega no governo da ex-presidente Dilma Rousseff e presidente do BB, no governo de Michel Temer.
Bolsonaro, segundo fontes, teria determinado uma “limpeza”, nas estatais e empresas ligadas de nomes que fizeram parte do governo do PT, o que teria pesado da renúncia de José Maurício.
A troca de comando na Previ ocorre poucas semana depois de a direção da Caixa Econômica Federal promover a troca de diretores indicados pelo banco estatal na cúpula da Funcef, a fundação de previdência dos funcionários.
Previ defende trabalho
Logo após o anúncio da saída de José Maurício ontem, a Previ divulgou nota em que destaca o trabalho conduzido pelo executivo na fundação, sem citar o que teria motivado sua saída. O texto afirma que ele conduziu a entidade “com segurança por cenários desafiadores, com resultados positivos durante toda a sua gestão”.
Segundo a Previ, a gestão de José Maurício conseguiu reverter, já no fim de 2018, seis meses após sua posse, o déficit do ano anterior, mantendo superávits desde então. O comunicado ressalta que mesmo em 2020, ano da pandemia, o resultado acumulado do principal plano foi positivo em R$ 13,9 bilhões e que a prévia até o mês de abril mostra um aumento relevante do superávit, que ultrapassa R$ 20 bilhões.
O resultado seria o maior superávit acumulado da Previ desde 2013.
Em outro trecho da nota, a Previ ressalta que foram reduzidas despesas administrativas em mais de R$ 20 milhões por ano com projetos que vão desde a otimização da sede, concluída em 2019, até a substituição de sistemas, o que resultaria em economia de custo e ganho de tempo.
Diretor do Sindicato dos Bancários do Rio e representante dos trabalhadores do BB, Alexandre Batista, diz que o receio da categoria é que a saída esteja relacionada a tentativas de influenciar o fundo:
"A Previ hoje é a galinha dos ovos de ouro, por ser o maior fundo de previdência fechado do país."