Dias após a divulgação dos dados do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, em 2019, que foi de apenas 1,1%, o governo federal comemorou o resultado por meio de postagem ao separar o PIB privado e o público.
Por meio de uma nota informativa, o Ministério da Economia divulgou uma análise sobre o resultado do PIB, sinalizando "a retomada da atividade", com foco no setor privado.
O informe publicado pela Secretaria de Comunicação da Presidência da República diz que o crescimento do setor privado foi de de 2,72% no 3º trimestre de 2019, em comparação com o mesmo período do ano anterior, enquanto o PIB do governo caiu 2,25%. A nota informativa do Ministério da Fazenda está disponível neste link.
A separação do PIB para fins da divulgação de resultados da economia do País levantou o debate, principalmente nas redes sociais, sobre a existência do conceito de PIB privado.
O Produto Interno Bruto é um indicador para medir a atividade econômica do País. “PIB = Consumo + Investimento + Gastos do Governo + Saldo da Balança Comercial. Alternativamente: PIB = soma dos salários, lucros, juros e alugueis. Não existem os conceitos “PIB Privado” e “PIB Público” – mas vou tentar cunhar o conceito “Pedalada intelectual”. É esse aqui”, escreveu no Twitter o economista Gabriel Brasil, da Control Risks, ao retuitar a peça da Secom.
Em entrevista ao iG, Adriano Biava, professor de economia da Universidade de São Paulo (USP), explicou que a separação do PIB, entre o setor privado e público não é coerente porque o PIB é um só, baseado em regras internacionais.
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"Essa nomeação é só para desviar atenção da sociedade, mediante ao resultado ruim e a situação da economia do Brasil, completamente estagnada há quatro ou cinco anos. O que deve interessar é o País como um todo. Foram criados argumentos sem fundos com o intuito de criar fake news e distrair o debate necessário", explica Biava.
O professor diz que o PIB é realmente dividido em componentes, é calculada uma média e divulgada pelo IBGE. Ele complementa que tal distinção não causa efeitos diferentes no resultado baixo, de apenas 1,1%."O que ele chama de PIB privado é o resultado do setor privado, que foi maior realmente do que o público. Mas, no fim das contas, o PIB é uma coisa só, é o nosso conjunto de riquezas produzida no período que se refere", detalha.
O economista Jason Vieira também considera incoerente a publicação do governo federal. Ele diz que o conceito de PIB privado para fins de pesquisa e estudos até existe, é só olhar a composição do próprio PIB, mas a forma como o governo o utilizou tem fins políticos. "Isso é na verdade um arranjo de comunicação e retórica e dá margem para essa gritaria politizada que temos visto", analisa Vieira.
Ele destaca que os números são reais, se for analisar que o setor privado foi realmente melhor do que o setor público, em números consideráveis. "Mesmo assim, eu não utilizaria esse termo PIB privado porque soa estranho e nunca vi no mundo esse recorte para a publicação", pontua.
No Twitter, alguns estudiosos também se pronunciaram contra a publicação do governo federal. “Mas agora falando sério porque preciso calcular projeções aqui. Aquele PIB praça de alimentação de shopping entra no PIB privado ou PIB público quando quem tá almoçando é funcionário do governo?”, ironizou o economista e professor visitante da Universidade de Chicago Pedro Amaral.
“O duplipensar bolsonarista tenta subverter até a mais elementar das identidades contábeis PIB privado x PIB público é o equivalente a 2 + 2 = 5 na obra de ficção de Orwell que transformarmos em documentário por aqui”, escreveu o também economista Alexandre Andrada, da UnB.
Por meio da nota informativa, o governo diz que a trajetória recente de redução dos juros tem criado um ambiente mais favorável para o investimento na economia
"Uma vez que diminui o custo do capital. Ademais, a combinação dos juros mais baixos com um cenário de inflação controlada e uma alocação mais eficiente dos recursos prefiguram a estabilidade econômica, importante para projetos de longo prazo como é o caso de diversos investimentos. Nesse sentido, é importante destacar que a taxa de juros é a mais baixa da série histórica. Esse fato é resultado de um equilíbrio fiscal crível, o que tem se refletido também em uma trajetória controlada inflação. Destaca-se que em 2019 há um ritmo de crescimento privado substancial, mesmo sem haver estímulos de gastos do governo ou do setor externo. Logo, trata-se de um crescimento mais sólido e que tende a apresentar aceleração em 2020", diz trecho do informe.