Futuro das florestas depende de uso das técnicas de manejo
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Futuro das florestas depende de uso das técnicas de manejo

POR ERIC BASTOS GORGENS

Pense num caminhão cheio de toras de madeira trafegando por uma região Amazônica. Tenho certeza de que a imagem lhe trouxe um sentimento ruim. Muito provavelmente, um sentimento associado à uma conexão que você fez do caminhão com o desmatamento.

Esta percepção predominantemente ruim sobre o corte de árvores está enraizada em nossa sociedade e traz sérias consequências quando se deseja debater o futuro de nossas florestas. O desafio deste texto é fazer você considerar uma outra perspectiva para esta imagem, e consequentemente enxergar as florestas de outra forma.

Desmatamento legal e ilegal

Antes de mais nada, é preciso deixar claro que nem todo desmatamento é ilegal. O desmatamento pode ser definido como a remoção completa de toda a cobertura vegetal. Ele pode estar associado a uma autorização de intervenção ambiental. Em geral, quando existe a necessidade de dar um novo uso à terra, a remoção da vegetação é solicitada ao órgão ambiental na fase inicial de implantação do novo empreendimento.

O desmatamento se torna uma prática ilegal quando utilizado para forçar a conversão da terra visando promover a expansão de uma determinada atividade, como a agropecuária. Por exemplo, quando utilizado como mecanismo de apropriação indevida de uma área, numa tentativa de legitimar a posse de terras públicas. É o que chamamos de “grilagem”, uma das maiores causas do desmatamento ilegal no Brasil. Estudos mostram que 51% do desmatamento do bioma amazônico, entre 2019 e 2021, ocorreu em terras públicas.

Mas obter os números do desmatamento legal no Brasil ainda é um desafio. O painel madeireiro do IBAMA apresenta que em 2023 foram autorizados 2.790 pedidos de supressão, para uma área total de 101.383 hectares. No entanto, este número certamente é muito maior, uma vez que estados e municípios possuem autonomia para autorizar alguns projetos de licenciamento ambiental.

Segundo o MapBiomas, o desmatamento no Brasil foi de 1.829.597 hectares de vegetação nativa em 2023. Destes, 490.038 hectares têm sobreposição a alguma autorização registrada no Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais (Sinaflor) ou nos sistemas estaduais consultados. Desta forma, 26,8% da área desmatada em 2023 foi de forma aparentemente legal.

A floresta como recurso

Mas explorar a floresta e cortar árvores pode ser algo bom, até mesmo necessário (e existe um nome para isto: manejo florestal). É fundamental reconhecer a função do manejo florestal que, além de garantir a oferta de madeira de origem sustentável, garante também a saúde das nossas florestas. O manejo florestal busca, por meio de um planejamento rigoroso e uma sólida base ecológica e matemática, determinar formas sustentáveis de aproveitar os recursos florestais.

Os recursos florestais sempre foram fundamentais na sobrevivência da Humanidade, provendo alimentação, ferramentas, calor e abrigo. Em seguida, a madeira também passou a ser essencial para o desenvolvimento econômico, fornecendo energia para as máquinas (lenha e carvão) e material para a construção civil e instalações industriais. No século 18, frente aos primeiros sinais de escassez de madeira em algumas regiões da Europa, nasce o manejo florestal como ciência.

Uma floresta nativa madura, sem nenhuma intervenção humana, será resultado de quatro forças que compõem a dinâmica florestal: ingresso, crescimento, envelhecimento e mortalidade. Apesar de algumas árvores terem ciclos de vida longos, elas também envelhecem e morrem. As causas da mortalidade são as mais diversas: de doenças a ventos, passando até mesmo por raios e deslizamentos de terra. Ao morrer, todo o carbono estocado na estrutura da árvore é liberado para atmosfera, por meio dos agentes decompositores. Por outro lado, as árvores crescem, acumulando biomassa em seu corpo por meio da fotossíntese.

A fotossíntese é o processo pelo qual as plantas usam a energia da luz solar para converter dióxido de carbono e água em glicose e oxigênio. Além de crescer, árvores maduras são capazes de se propagar, principalmente por meio da produção de sementes. Estas, quando dispersas e encontrando uma situação ideal, germinam produzindo novas árvores. Atingir a maturidade tem como consequência natural o envelhecimento da árvore. Seu vigor diminui, resultando na redução de atividade fotossintética e no surgimento de ocos em sua madeira.

As florestas têm uma característica peculiar: existe um descompasso entre estes elementos da dinâmica florestal. O tempo associado aos processos de criação numa floresta (crescimento e ingresso) é muito mais lento do que os processos de destruição (envelhecimento e mortalidade). Esta é uma característica das florestas: a entrada de biomassa no sistema é lenta e gradual, mas as perdas de biomassa são rápidas e intensas.

De uma hora para outra, por exemplo, uma forte rajada de vento (também conhecida como blowdown ) pode causar a mortalidade de uma grande quantidade de árvores. Ainda mais frequentes são as clareiras (aberturas do dossel) resultantes da mortalidade de uma ou poucas árvores.

Estima-se que distúrbios ocorrem com frequência de retorno que podem chegar a 17 anos, dependendo da escala espacial analisada. Eles são fundamentais para promover a diversidade e o rejuvenescimento da floresta: 75% das espécies que habitam o dossel da floresta dependem das clareiras para regeneração.

Indo contra o senso comum, uma floresta antiga, que não passou por nenhum distúrbio, não é uma floresta sadia. Nesta situação, as árvores estão envelhecidas e ocadas. Muitas espécies já deixaram a área devido à competição.

A floresta está estagnada, reduzindo assim a sua capacidade de sequestrar carbono por meio de processos criativos como ingresso e crescimento. Alia-se ao fato de que, quando eventos naturais de mortalidade ocorrerem (e vão ocorrer!), uma grande quantidade de carbono estocado em árvores grandes e velhas será rapidamente liberada para a atmosfera.

A importância do manejo florestal

É aqui que entra a importância do manejo florestal. Os quatro elementos da dinâmica florestal são essenciais para a concepção do manejo florestal. O manejo florestal define a intensidade de exploração de forma que a quantidade de madeira explorada (intensidade de exploração) seja balanceada pelo crescimento natural da floresta (taxa de crescimento e ingresso) ao longo de um determinado tempo (ciclo de corte).

Quando bem implementado, o manejo busca antecipar o que ocorreria naturalmente na floresta, promovendo o rejuvenescimento e não deixando que a floresta atinja um ponto de estagnação. Somente em 2023 foram autorizados 627 novos planos de manejo segundo o Sinaflor, totalizando 4.531.143 hectares. De efetiva exploração, no ano em questão foram concedidas 646 autorizações para planos de operação em 340.768 hectares. O Brasil tem um enorme potencial de multiplicar as áreas florestais sob manejo.

Um exemplo da importância do manejo florestal para a diversidade das florestas pode ser visto na Alemanha. O professor Ernst-Detlef Schulze, diretor emérito do Instituto Max Planck, convida a conhecer de perto duas áreas florestais distintas. Uma floresta antiga intocada há muito tempo e outra recém manejada por ele mesmo. Visualmente a diferença é notória.

Numa das áreas avistam-se árvores grandes e velhas, as copas destas árvores se encontram e formam um dossel alto e denso. Uma única espécie domina a paisagem. Embaixo dessas árvores, um tapete de folhas e musgos, com poucas arvoretas em regeneração. Na outra, árvores de todos os portes e tipos dividem o mesmo espaço, num aparente caos. Nota-se claramente a capacidade do manejo florestal de promover maior diversidade e vitalidade.

Discutir o futuro de nossas florestas depende de percepções que vão muito além do senso comum, e de uma visão puramente ambientalista. Incentivar que mais caminhões cheios de toras de madeira saiam da floresta não é ruim, desde que saiam de áreas de manejo florestal. Quando uma floresta está sendo manejada, há certamente um responsável técnico e muita ciência por trás das decisões de intervenção.

Eric Bastos Gorgens – Professor e pesquisador da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM).

Este texto foi republicado de The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original.

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Foto: Hans Verburg/Canva
O manejo florestal define a intensidade de exploração de forma que a quantidade de madeira explorada seja balanceada pelo crescimento natural da floresta

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