Giselle Tapai: Mulheres com câncer têm direito a tratamento integral

Autora é mestre em Direito e especialista em litígios que envolvem planos de saúde

            Por Giselle Tapai*
          
Conhecer os direitos ajuda a ficar vigilante com falhas de atendimento dos planos de saúde
Foto: A Taras Grebinets/Shutterstock
Conhecer os direitos ajuda a ficar vigilante com falhas de atendimento dos planos de saúde

Neste mês da conscientização do câncer de mama, muito se falou sobre as questões relacionadas à prevenção da doença, que devem sempre ser enfatizadas. Mas buscar informações sobre os direitos das pacientes também é fundamental.

Infelizmente, nos momentos mais críticos da doença, é corriqueiro que os companheiros não consigam dar o apoio adequado à mulher e muitos até abandonam o lar. Além desta triste realidade, as mulheres passam por outros problemas como falta de autoestima, conflitos com os filhos, preconceito e retaliações no ambiente do trabalho.

Não bastasse tudo isso, elas ainda sofrem com as negativas e enfrentamentos com os planos de saúde. Muitos negam exames e procedimentos, ou quando permitem, é de forma lenta e burocrática, tornando penoso o que deveria ser prioritário. A situação é complicada, pois elas dependem dos convênios para o tratamento e se sentem constrangidas por lutar pelos seus direitos.

As negativas e abusos são muitos frequentes nesta seara e, portanto, essa luta é real. As mulheres, já tão fragilizadas pela doença, não deveriam ter que experimentar essa rotina de descaso, porque a lei lhes garante este direito. Para isso, é necessário enfatizar os principais pontos, para que a luta seja um pouco mais equilibrada.

Todas as mulheres com câncer de mama têm direito a receber do seu convênio todo o tratamento necessário - chamado tratamento integral - desde o diagnóstico até procedimentos oncológicos e o fornecimento de medicamentos necessários para o cuidado integral da saúde. Esse princípio é basilar e jamais pode ser colocado em segundo plano.

Porém, até mesmo antes desta questão muitas mulheres já não têm seus direitos garantidos: muitos planos de saúde recusam a venda para a paciente com câncer de mama. A conduta é discriminatória e enseja indenização por danos morais. Portanto, muita atenção ao caso desta recusa. Procure salvar mensagens e conversas telefônicas que podem servir de prova dessa conduta abusiva.

Também existem as controvérsias logo após a aquisição, no chamado “período de carência”, tempo que o beneficiário deve esperar para ser atendido pelo plano de saúde. De acordo com a Agência Nacional de Saúde (ANS), uma doença ou lesão preexistente jamais poderá ser omitida pela contratante.

Nestes casos, a carência é de dois anos e deve ser respeitada. Contudo, durante esse período, a paciente tem direito à Cobertura Parcial Temporária, podendo realizar procedimentos de baixa complexidade, como consultas e exames laboratoriais, e isso tudo, conforme as regras estabelecidas em contrato.

Casos de urgência e emergência, porém, devem ser tratados de forma diferenciada: a paciente com câncer, em situação urgente, deve ter cobertura 24h após a assinatura do contrato. Todos os procedimentos necessários à preservação da saúde devem ser realizados, independentemente dos custos ou nível de complexidade.

Infelizmente, muitas vezes os planos negam essa assistência alegando carência, o que pode ser revertido facilmente na Justiça. É importante observar que em planos coletivos empresariais, com mais de 30 segurados, não se aplica nenhuma carência.

Nas situações urgentes ou emergenciais, também é corriqueira a alegação das operadoras de saúde em cobrir o atendimento médico somente durante as primeiras 12 horas após a internação. Este tipo de restrição, mesmo quando estabelecida em contrato, também é considerada abusiva pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A lei é clara: quando houver suspeita de câncer de mama é direito das mulheres que os exames necessários para a confirmação da doença sejam realizados no prazo máximo de 30 dias. E, confirmado o diagnóstico, o tratamento deve ser iniciado em, no máximo, 60 dias, com a realização de procedimento cirúrgico ou com o início de radioterapia ou quimioterapia, conforme orientação médica. O tratamento rápido é a chave para a cura, e portanto, constantemente amparado pelos juízes.

Foto: Divulgação
A advogada Giselle Tapai

Ainda falando em exames a medicina moderna possui exame genéticos preventivos para verificar a propensão ou não de desenvolver câncer de mama no futuro, que são constantemente negados. A alegação mais corriqueira da negativa é sempre porque não constam do rol da ANS.

Outo direito importante a ser destacado é o Home Care. Seja pela condição da paciente, ou pela idade, o médico pode entender que receber o tratamento em casa pode ser mais efetivo e humano. Assim, mesmo que não previsto em contrato, a paciente pode requisitar o tratamento em casa. A negativa neste caso é considerada prática abusiva também, se solicitado pelo médico.

Em caso de mastectomia as pacientes têm o direito garantido à reconstrução da mama, plásticas reparadoras e manutenção da prótese. É obrigatória a reconstrução mesmo se o tumor retirado não for maligno.  A cirurgia reparadora, inclusive, deve ser realizada preferencialmente no mesmo dia da retirada do tumor e, se for necessário, também é assegurado o direito de operar a outra mama, mesmo não afetada pela doença.

O tratamento deve ser completo: diagnóstico do problema, cirurgia reparadora e acompanhamento psicológico especializado.

Se qualquer uma das situações citadas acima acontecer, a mulher deve recorrer à Justiça para obter uma decisão liminar que obrigue a operadora a cobrir o procedimento ou exame. Geralmente, dependendo da questão de urgência - e do juiz - a liminar pode ser concedida no mesmo dia ou até em horas.

Por fim, com conhecimento e amparo de profissionais adequados, o enfrentamento diário pela busca pelo tratamento ideal e pela cura será mais efetivo e muito mais humanizado.

*Giselle Tapai é advogada formada pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) e Mestre em Direito pela Universidade Mackenzie, Giselle já foi professora na Universidade São Francisco e tem sólida e marcante atuação no segmento, principalmente em litígios que envolvem planos de saúde (reajustes, obtenção de medicamentos, próteses, exames, entre outros). Também é autora de diversos artigos e livros jurídicos sobre o tema, além de ser palestrante e parecerista.