Após 25 anos de negociações, os blocos do Mercosul e da União Europeia anunciaram na última sexta-feira (6) um acordo que visa alavancar o comércio entre as duas regiões. Entre as principais vantagens do acordo, prevê-se a ampliação de mercado para os produtos nacionais, porém, a entrada de produtos europeus com menores tarifas podem ameaçar a indústria nacional.
O anúncio foi feito durante a Cúpula do Mercosul, no Uruguai, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros líderes do bloco. A presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, também esteve presente.
O acordo prevê a redução de tarifas comerciais e facilitação de investimentos, com a expectativa de impulsionar o comércio entre os dois continentes e fortalecer as duas regiões em um cenário global cada vez mais polarizado entre China e Estados Unidos, especialmente com o retorno de Donald Trump ao poder, que poderá adotar políticas mais protecionistas.
Segundo a professora Cristina Helena de Melo, do curso de economia da PUC, o maior ponto positivo do acordo é a ampliação do mercado para colocação de produtos brasileiros.
"No âmbito do acordo, há custos de negociação e de impostos reduzidos, taxas, tarifas, enfim. Então, é possível ser mais competitivo", diz.
Porém, ela alerta que há setores da indústria que vão ser impactados pela entrada de produtos europeus mais competitivos, o que pode fazer com que ocorra desmantelamento de setores que estavam aqui empregando e gerando renda.
"Mesmo filiais de empresas europeias que estavam aqui vão precisar ser revistas. Pra que manter plantas produtivas no Brasil se você pode comprar de fora mais barato? É preciso ter uma política de apoio a esses setores", destaca.
"Quando a gente desindustrializa, a gente perde capacidade de geração de emprego e renda, então esse é o nosso principal ponto de atenção. Se a gente ameaça de alguma forma a agricultura deles, com a nossa que é mais vantajosa, a nossa indústria também será ameaçada pelos produtos vindos da Europa", completa.
PIB Brasileiro
Um estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) no início de 2024 indicou que o acordo pode gerar impactos positivos para o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.
Entre 2024 e 2040, o PIB do país teria um aumento acumulado de 0,46%, o equivalente a US$ 9,3 bilhões por ano. O estudo também projetou um aumento de 1,49% nos investimentos no Brasil, além de mudanças na dinâmica das importações e exportações.
As importações brasileiras cresceriam nos primeiros anos do acordo, alcançando um pico de US$ 12,8 bilhões em 2034, antes de recuar para US$ 11,3 bilhões em 2040. As exportações brasileiras, por sua vez, aumentariam continuamente, com um ganho acumulado de US$ 11,6 bilhões.
O acordo tem o potencial de tornar os produtos brasileiros mais competitivos no mercado global, graças à redução de tarifas na União Europeia, concessões de cotas de exportação e queda nos custos domésticos de insumos e bens de capital.
No entanto, existem setores que manifestam preocupações sobre os impactos do acordo. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) e outros sindicatos sul-americanos criticam o acordo, argumentando que ele pode colocar em risco empregos industriais no Brasil, uma vez que as empresas brasileiras não seriam tão competitivas quanto as europeias.
Por outro lado, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) apoia o acordo, destacando que a redução das tarifas de importação pode beneficiar a indústria brasileira ao baratear os insumos importados da Europa e abrir novos mercados para produtos brasileiros no bloco europeu.
Em um documento divulgado em novembro de 2024, a CNI, juntamente com 78 outras associações empresariais da União Europeia e do Mercosul, enfatizou a importância do aprofundamento das relações comerciais para garantir a resiliência econômica diante das turbulências geopolíticas e das crises econômicas.
O setor agropecuário brasileiro também se beneficiará do acordo, com destaque para a redução a zero de tarifas para frutas, a eliminação da tarifa de 9% sobre o café solúvel, e a criação de cotas adicionais para carne, com tarifa reduzida de 7,5%, que atualmente é de 43% extra-cota.
A cota para o setor de aves também terá tarifa zero. O acordo assegura que 91% das importações originárias da União Europeia estarão livres de tarifas, além de garantir que fornecedores de bens e serviços sejam tratados como se fossem domésticos.
Os principais produtos agropecuários que se beneficiarão da assinatura do acordo incluem lácteos, azeite, vinhos e frutas temperadas, itens que o Brasil não produz em grande escala. Assim, a agropecuária e a indústria automotiva estão entre os setores que podem ser mais impactados positivamente pelo tratado.