Veja as reações da imprensa nos países europeus com o acordo Mercosul-UE

O Le Monde, da França, falou em "rebelião francesa", enquanto o Die Presse, da Áustria, afirma que o acordo é o melhor para a economia

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen (C), cumprimenta o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Montevidéu, Uruguai, 6 de dezembro de 2024
Foto: EITAN ABRAMOVICH
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen (C), cumprimenta o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Montevidéu, Uruguai, 6 de dezembro de 2024


O Mercosul e a União Europeia anunciaram um acordo de livre comércio , nesta sexta-feira (6), após 25 anos de negociações. O texto ainda precisa ser validado nos dois blocos econômicos e não há prazo para entrar em vigor.

Na Europa , parte da imprensa viu o anúncio do acordo com cautela. Enquanto alguns veículos de imprensa observaram vantagens em uma parceria com o bloco sul-americano , outros criticaram trechos do texto em relação à economia e ao meio ambiente. Veja como alguns jornais de países da União Europeia noticiaram o acordo.

Zeit Online, da Alemanha: “A luta errada”

É bem possível que mais uma vez o acordo não se concretize. Sobretudo na França e na Polônia, os governos resistem, curvando-se à pressão de seus agricultores. Isso já transcorreu assim várias vezes, por fim em dezembro de 2023. No último minuto, exigiram-se, por vontade da União Europeia, emendas ao acordo pronto em questões ambientais e das cadeias de abastecimento – possivelmente uma tática de procrastinação.

(...) Partidários do acordo contrapõem aos agricultores em protesto que ele de modo algum prevê a importação de volumes ilimitados de produtos agrícolas para a Europa. Em relação à carne bovina, por exemplo, vigoram limites estreitos. E há também a contrapartida de que os próprios fazendeiros europeus vão poder exportar muito para a América do Sul: frutas, legumes, óleos, até carne de vaca.

O outro argumento é que nem sempre se deve seguir a vontade dos agricultores. Grandes vantagens do acordo estão em setores economicamente mais importantes, como engenharia mecânica, energia verde, química, exportações tecnológicas da Europa para a Argentina, importação de matérias-primas cobiçadas do Brasil para a Europa.

Die Presse, da Áustria: “Acordo do Mercosul: Alcançado consenso político básico”

Quanto à criação de uma zona de livre comércio entre a UE e o Mercosul, na realidade já se havia alcançado um consenso político básico no verão de 2019. Entretanto o pacto voltou a ser questionado por diversos Estados-membros da UE, como França, Polônia ou Áustria, e seguiram-se anos de novas negociações.

A postura contrária da Áustria quanto ao acordo do Mercosul está constitucionalmente congelada desde 2019, por um veto do Conselho Nacional [...].

O acordo entre a UE e os países do Mercosul criaria uma das maiores zonas de livre comércio do mundo, com mais de 700 milhões de habitantes. Ela visa, acima de tudo, reduzir taxas aduaneiras e assim propiciar o comércio.

Políticos do comércio veem no planejado acordo, além disso, uma mensagem ao futuro presidente americano Donald Trump, e um importante passo na luta de concorrência com a China. A ideia é mostrar a Trump que, no longo prazo, acordos de livre comércio em funcionamento são melhores para a economia nacional do que a alienação de mercados com novas tarifas e outras barreiras comerciais.

Le Monde, da França: “França: acordo só envolve a Comissão Europeia”

Desde o verão se aceleraram as discussões entre a Comissão Europeia, que negocia em nome dos Vinte e Sete [membros da UE] e o Mercosul. Já em dezembro de 2023, Ursula von der Leyen pensava que o acordo estava ao alcance da mão, mas teve que renunciar in extremis. Emmanuel Macron – de que ela ainda precisava para ser reconduzida à liderança da Comissão, após as eleições europeias de 9 de junho – lhe expressara mais uma vez sua oposição categórica. 

Faz 25 anos que a Comissão Europeia e o Mercosul negociam. Em 2019, já se alcançara um acordo entre as duas partes, mas a França assumiu a liderança da rebelião, convencendo vários outros Estados europeus, a começar pela Alemanha. O Executivo comunitário, de fato, não tem poder de ratificação: este fica nas mãos dos Estados-membros e Parlamento Europeu, os únicos que podem lavrar em pedra um tratado comercial.

Libero Quotidiano, da Itália: “Giorgia Meloni detém Von der Leyen: 'Não há condições para assinar'”

À oposição da França e da Polônia, soma-se o "alto lá" italiano. O governo – informavam na noite de ontem [05/12] fontes do Palácio Chigi – sustém que não há condições para firmar o atual texto do acordo de associação UE-Mercosul, e que a assinatura só virá havendo condições de tutela adequadas e compensações para eventuais desequilíbrios do setor agrícola [...].


Em nossas mesas vão chegar bifes e hortaliças com um impacto ambiental bem superior ao dos produzidos no Velho Continente, apesar da guinada "green" feita sobre os ombros dos agricultores e na pele dos consumidores.

Sem contar que, com o previsível boom das exportações de produtos alimentares do Mercosul, teremos transferido as emissões carbônicas para além dos confins da Europa – multiplicando-as, visto que cultivadores e criadores sul-americanos não hão de estar sujeitos às constrições ambientais impostas por Bruxelas.