Os Estados Unidos terão a eleição presidencial de 2024 na próxima terça-feira (5). O resultado impactará não somente a população que vai às urnas, mas economias de diversos lugares do mundo, incluindo a do Brasil. Nos últimos meses, Kamala Harris
, vice-presidente, e Donald Trump
, ex-presidente, tiveram disputas e discussões ferrenhas sobre sociedade e economia.
Para entender como a vitória de Trump ou Harris pode impactar o Brasil, principalmente em questões econômicas, o iG conversou com diversos especialistas financeiros. Eles comentaram os possíveis pesos das políticas externas e decisões econômicas no mercado global, e efeitos sentidos pelo Brasil. Confira:
Trump, ex-presidente
Donald Trump , durante o primeiro mandato, implementou uma série de políticas protecionistas do país, incluindo a imposição de tarifas sobre importações e uma travada nas relações internacionais. O principal objetivo era proteger a indústria americana. As decisões, porém, geraram tensão com antigos parceiros comerciais, devido a quebras diplomáticas.
Na corrida eleitoral de 2024, Trump sugeriu que não pegaria leve nos impostos. Chegou a sugerir, inclusive, impostos de 20% em importações gerais e 500% em importações de carros mexicanos. "A política protecionista e de tarifas elevadas pode impactar diretamente as exportações brasileiras, especialmente em commodities e bens industriais", disse Hugo Garbe , professor de Ciências Econômicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie , em São Paulo. Isso significa que setores-chave da economia brasileira, como o agronegócio e a indústria, poderiam enfrentar desafios significativos caso Trump ganhasse e cumprisse as promessas
Kamala Harris, nova promessa
Por outro lado, os especialistas acreditam que candidatura de Kamala Harris representa uma mudança significativa na abordagem do comércio e relações internacionais. Ela tende a manter uma política mais multilateral, focada em parcerias e acordos voltados para o desenvolvimento sustentável e justiça social.
"Harris provavelmente buscará um alinhamento com temas ambientais e sociais, criando uma oportunidade para o Brasil cooperar em áreas como o meio ambiente e direitos humanos", destacou Garbe. Essa mudança poderia trazer benefícios diretos para o Brasil, especialmente em termos de acordos comerciais mais favoráveis e investimentos em setores sustentáveis.
Impactos das eleições nos EUA no Brasil
Existem diversos pontos e modos como as eleições podem afetar o Brasil. Entre os principais estão: relações comerciais, influência sobre o valor do dólar e reação esperada do governo brasileiro a cada resultado eleitoral.
Influência na economia brasileira
- Na vitória de Trump
Na opinião de especialistas, a reeleição de Donald Trump pode trazer um cenário desafiador para o Brasil. "A continuidade de políticas protecionistas e possíveis sanções comerciais aumentariam a percepção de risco global, pressionando o dólar para cima", afirmou Sidney Lima, analista da Ouro Preto Investimentos . O impacto disso é: dólar alto, real desvalorizado — além de uma piora na inflação e detrimento do poder de compra dos brasileiros.
Com uma balança comercial vulnerável, o Brasil pode enfrentar dificuldades adicionais para exportar produtos, especialmente se estiverem em competição direta com alguma produção dos EUA. O protecionismo de Trump, incluindo tarifas elevadas, poderia levar a uma desaceleração nas exportações e prejudicar setores essenciais da economia.
O comportamento isolacionista de Trump pode dificultar a colaboração em questões estratégicas, como mudança climática e saúde global, áreas nas quais o Brasil trabalha para evoluir nos últimos anos. "Uma postura mais isolacionista pode reduzir a cooperação em áreas estratégicas, afetando setores como agronegócio e energia", acrescentou Garbe.
- Na vitória de Kamala Harris
A vitória de Kamala Harris poderia ser mais favorável ao Brasil. "Com Harris, espera-se que mantenha uma abordagem mais multilateral e cooperativa, com foco em parcerias ambientais e comerciais", disse Garbe. Esse alinhamento poderia resultar em uma maior estabilidade nas relações comerciais entre Brasil e EUA, permitindo ao Brasil benefícios maiores, pois as ideias de ambos os lados estão alinhadas e têm objetivos semelhantes.
Além disso, a expectativa é uma política fiscal expansionista e mais amena, e isso poderia levar a um investimento maior na energia renovável. E, falando em energia renovável, poucos países são mais aptos a representar do que o Brasil. "Com uma política fiscal expansionista, é possível que o Brasil receba mais investimentos em setores que buscam desenvolver soluções sustentáveis", comentou Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike .
Assim, uma parceria entre EUA e Brasil, com governos alinhados no mesmo objetivo, poderia ser bastante proveitosa, pois facilitaria o estímulo e acesso a dinheiro, investimentos, tecnologias mais avançadas e práticas sustentáveis.
Como eleições impactam o dólar
Poucas coisas variam e se alteram mais do que o valor do dólar nas eleições dos EUA. Usado como moeda global, qualquer variação, mudança e incerteza da política estadunidense têm impactos gigantes na economia mundial. É importante entender como ambos cenários influenciam essa variação.
- Na vitória de Trump
Uma reeleição de Trump tende a aumentar o dólar, principalmente pelas políticas autocentradas no país que ele quer adotar. "A eleição de Trump tende a pressionar ainda mais o dólar para cima, com políticas que restringem o comércio e incentivam um dólar forte", explicou Lima.
Boa parte disso é porque a mudança de presidente e investimentos natais aumentam a insegurança de investidores em mercados externos. Assim, ativos seguros e mais bem estabelecidos são mais procurados, aumentando o dólar e desvalorizando moedas de países mais fracos e emergentes.
Para o Brasil, isso significa um provável aumento na inflação. "Um dólar mais forte torna as importações mais caras, o que pode pressionar os preços ao consumidor e afetar a economia de maneira geral", destacou Eyng. A desvalorização do real frente ao dólar também pode elevar o custo de vida e causar impacto em populações socialmente vulnerável.
- Na vitória de Kamala Harris
Apesar de não haver promessas ou certezas, a vitória de Kamala Harris pode resultar em uma estabilização ou mesmo desvalorização do dólar. "A eleição de Harris poderia sinalizar maior estabilidade política e previsibilidade, levando a uma maior confiança dos investidores em mercados emergentes", afirmou Lima.
Espera-se que uma possível eleição de Harris resulte em um ambiente mais favorável para a recuperação econômica, não apenas dos EUA, mas também de países emergentes. Isso reduziria a pressão inflacionária no Brasil e estimularia o fluxo de capital estrangeiro, além de possivelmente melhorar aportes internacionais.
"Com um foco em crescimento sustentável, é possível que o Brasil veja um aumento no investimento estrangeiro, favorecendo a economia local", concluiu Eyng.
Por que a política influencia a economia?
Eleições em grandes economias, como nos EUA, geram incertezas e impactam decisões de investimento em praticamente todos os países do mundo. Durante esses períodos, os mercados financeiros experimentam grandes oscilações. Esse “vai-não-vai” leva os investidores a reavaliar riscos e ajustar carteiras, resultando em volatilidade nos mercados financeiros.
"As oscilações econômicas durante eleições ocorrem devido à incerteza sobre futuras políticas econômicas, fiscais e comerciais que cada candidato implementará", explicou o professor Garbe.
Investidores e empresas se tornam mais cuidados durante eleições, e isso afeta mercados acionários, taxas de câmbio e preços das commodities. No caso do Brasil, essa volatilidade causa repercussões no câmbio e impacta o fluxo de capital, ainda mais quando consideramos uma saúde não tão boa da economia brasileira.
Provável reação do governo brasileiro
Pensando nos impactos citados acima, pode-se esperar que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se beneficiaria mais com a vitória de Harris, de acordo com especialistas. Não apenas pelos dois governantes serem mais alinhados politicamente, mas pelos ideais de economia do momento em cada um dos países.
- Na vitória de Trump
No cenário de reeleição de Trump, o mais provável é que o governo brasileiro tente uma aproximação com os EUA com objetivo de diminuir tarifas de exportação e manter aberto o comércio entre Estados Unidos e Brasil. "O governo brasileiro provavelmente reforçaria suas relações diplomáticas com os EUA, buscando estratégias para mitigar o impacto das tarifas e tentar manter o acesso aos mercados americanos", comentou Garbe.
Isso incluiria a diversificação das exportações e a busca por relações econômicas com outros mercados, para ampliar a carteira e reduzir a dependência do comércio com os EUA. Parcerias com mais países poderiam minimizar alguns dos impactos negativos das políticas de Trump. Além disso, a diplomacia brasileira poderia buscar soluções para lidar com tarifas e encontrar maneiras de garantir acesso ao mercado estadunidense.
- Na vitória de Kamala Harris
Uma vitória de Kamala Harris criaria a necessidade de correr para garantir uma maior cooperação em políticas ambientais e de direitos humanos. É necessário termos a capacidade de atender expectativas e conseguir negociar muito bem para atrair a atenção da possível presidente, segundo os especialistas. "Com uma vitória de Harris, o governo brasileiro possivelmente se prepararia para uma maior cooperação em políticas ambientais", acredita Lima.
** Jornalista pelo Mackenzie e cientista social pela USP, trabalha com redação virtual desde 2015 e teve passagem em grandes redações do Brasil. Curte cultura, política e sociologia.