Banco Central do Brasil e dos EUA anunciam juros nesta 'Super Quarta'

Enquanto no exterior, expectativa é por nova alta agressiva nos juros, na cena local, investidores aguardam final do ciclo de elevações da Selic

'Super Quarta': bancos centrais de Brasil e EUA anunciam decisões sobre juros hoje; veja previsões do mercado
Foto: Fabrizio Gueratto
'Super Quarta': bancos centrais de Brasil e EUA anunciam decisões sobre juros hoje; veja previsões do mercado

A quarta-feira (21) dos mercados é marcada pelo anúncio de importantes decisões de  política monetária nos Estados Unidos e no Brasil.

Enquanto na cena interna, a expectativa é que seja anunciado o fim do ciclo de altas da Selic, por lá, os investidores já aguardam um terceiro aumento consecutivo de 0,75 ponto percentual por parte do Federal Reserve, Banco Central americano.

Desde março, o Fed vem elevando as taxas de juros em um ritmo acelerado, parte de um esforço para combater uma inflação elevada e que continua próxima patamares não vistos em quatro décadas.
Caso as projeções se confirmem, a taxa de juros no país irá para o intervalo entre 3% a 3,25%, maior nível em 14 anos.

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Analistas de mercado até esperavam que os preços caíssem com mais intensidade em agosto em relação a julho devido à queda da gasolina, o que poderia abrir caminho para um Fed menos agressivo.

No entanto, a divulgação do índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) de agosto jogou um balde de água fria nas expectativas.

O CPI subiu 0,1% em agosto ante julho e atingiu 8,3% em 12 meses. Os números até mostraram uma desaceleração ante os 8,5% registrados em julho, mas vieram acima das expectativas, que giravam em torno de 8,1%.

O núcleo do índice, que exclui componentes voláteis de alimentos e energia, avançou 0,6% na comparação mensal e 6,3% na base anual, também acima das projeções de 6,1%.

Vale lembrar que a meta de inflação do Fed é de 2%.

Discurso duro

Após os dados de inflação, os índices acionários passaram por vários pregões de baixa e o dólar se valorizou. O movimento foi influenciado pelo fato de parte do mercado já admitir a possibilidade de uma alta de até 1 ponto percentual, algo que não ocorre desde a década de 1980, e que estava completamente fora do radar há algumas semanas. 

Mas as apostas no 1 ponto percentual ainda são minoritárias. Dessa forma, as atenções vão se voltar para o discurso do presidente do Fed, Jerome Powell, após o anúncio da reunião.

"Nossa expectativa é de 0,75 ponto percentual. E essa magnitude de aumento, historicamente, já é bastante agressiva para o Banco Central americano. Destacamos a importância da gradualidade na conduta da política monetária, porque ela atua com atraso de seis a doze meses. Os aumentos que já foram feitos ainda não foram refletidos totalmente na economia, seja na atividade, na demanda, na inflação, no mercado de trabalho e imobiliário", disse o economista da XP, Francisco Nobre.

Na mesma linha, o economista-chefe da Knitro, Sávio Barbosa, acredita em uma nova alta de 0,75 ponto percentual nas taxas e a adoção de um discurso mais duro por parte de Powell.

"O tom da fala deve ser parecido com o que ocorreu no Jackson Hole. Na ocasião, ele destacou que o Fed precisa se preocupar com as expectativas de inflação. Mas ele deve manter a flexibilidade e não cravar qual será o próximo movimento." 

Para Barbosa, a taxa de juros deve terminar o ano próxima aos 4,5%. Segundo o economista da Knítro, as últimas declarações agressivas de Powell e de outros dirigentes do Fed postergaram o debate de quando os juros poderão começar a ser cortados para o final de 2023 e início de 2024.

Mercado de trabalho aquecido

E não é só para a inflação que o Fed olha. Outra variável importante que vem sendo observada pelo banco é o mercado de trabalho aquecido no país, o que ajuda a pressionar os preços.

Segundo dados do Departamento do Trabalho, a taxa estava em 3,7% em agosto, número considerado baixo.

A combinação de uma inflação elevada com um mercado de trabalho forte dificulta o trabalho do BC para trazer a inflação de volta à meta. Desde o início do processo de aperto monetário, diversos bancos e analistas já alertaram para a possibilidade de uma recessão na economia americana. 

Powell, por sua vez, defendeu em várias de suas falas a ideia de que um “pouso suave” na economia seria possível, ou seja, uma redução da inflação sem gerar graves prejuízos para a atividade. No entanto, essa defesa foi deixada em segundo plano nas suas últimas declarações.

"O índice de inflação nos Estados Unidos chegou a um patamar muito alto e o desemprego a um nível muito baixo. O Fed só vai conseguir fazer o trabalho dele quando observarmos um aumento da taxa de desemprego nos EUA. E o balanço do resto do mundo dificulta muito esse pouso suave", disse Barbosa.

A economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena Veronese, não acredita em uma inflação convergindo para a meta sem uma desaceleração mais forte da economia no país. Ela pondera que, caso a recessão venha, será de forma mais atenuada do que foi visto em outros períodos.

"Teve um componente de oferta, mas, hoje é basicamente uma inflação de demanda. E como você vai restringir a demanda sem desacelerar a economia. Não acho que vai ser uma desaceleração tão longa. Vamos passar por um período recessivo mais rápido do que foi em 2007 e 2008."

Previsões econômicas

O Fed também divulgará nesta quarta-feira o seu “dot plot” (gráfico de pontos), ou resumo das projeções econômicas. O gráfico mostra a mediana das expectativas dos dirigentes do banco para os juros, inflação, desemprego e Produto Interno Bruto (PIB) para os próximos anos. Esperam-se mudanças nas estimativas.

O último gráfico de pontos foi divulgado em junho e sugeria que a inflação, medida como despesas básicas de consumo pessoal, seria de 4,3% até o final de 2022 e 2,7% até o final de 2023. 

Os pontos de junho sugeriram que as taxas de juros seriam de 3,4% até o final de 2022 e 3,8% até o final de 2023. Atualmente, o mercado já precifica que as taxas estejam em 4,2% até o final do ano, atingindo o pico em março de 2023 em 4,5% e cortadas para 4% até o final de 2023.

"As projeções de médio e longo prazo de inflação devem vir convergindo para os 2%. A grande dúvida é a projeção de PIB, para ver se eles contemplam uma desaceleração forte do PIB ou se vão continuar no discurso do pouso suave. Na minha leitura com esse mercado de trabalho, controlar a inflação, passa necessariamente por desacelerar a atividade", afirmou a economista-chefe da B.Side Investimentos.

Copom: fim do ciclo de altas?

No caso brasileiro, o cenário é o oposto. A inflação ainda preocupa, mas o nosso Banco Central se encaminha para encerrar o ciclo de altas da Selic, que hoje está em 13,75%.

Essa é a avaliação da maior parte dos analistas de mercado, apesar das sinalizações mais duras por parte de autoridades do BC nas últimas semanas, incluindo o presidente da instituição, Roberto Campos Neto.

Mas a desancoragem das expectativas de inflação para 2024 e a composição ainda ruim da inflação corrente, com núcleos pressionados e difusão elevada, faz com que algumas casas esperem uma alta residual de 0,25 ponto percentual.

Levantamento feito pelo GLOBO com 25 casas, mostra que 21 delas acreditam que a Selic permanecerá em 13,75% e quatro projetam a taxa a 14% até o fim do ano.

"O que importa mais não é subir mais 0,25 ponto percentual, mas ver se eles vão fazer um discurso de fim de ciclo. É isso que o mercado quer saber", disse Helena.

As recentes políticas estimulativas por parte do governo para aquecer a economia tendem a dificultar a tarefa da autoridade monetária, já que estimulam a demanda pela injeção de dinheiro na economia. 

Com isso, mesmo que o BC encerre o ciclo de altas, a Selic deverá ser mantida em patamar restritivo por um período maior de tempo. Além disso, as expectativas de parte do mercado de ver cortes nos juros ainda no primeiro semestre de 2023 foram esfriadas.

"A inflação está desacelerando basicamente pelas desonerações e o fator petróleo ajudou. Mas o núcleo da inflação está muito ruim e os serviços ainda estão pressionados e parece que vai continuar."

Argumento para ter um discurso mais duro e para justificar a manutenção dessa taxa nos patamares atuais por mais tempo, o Banco Central tem", destaca a economista-chefe da B.Side Investimentos

Para os analistas, a continuidade de uma postura mais agressiva nos juros americanos não muda o cenário para o fim do ciclo da Selic, mas é um novo fator que justifica a permanência das taxas em um nível alto por um período de tempo maior.