Guedes 'debocha' do FMI e demonstra 'despreparo', dizem economistas
Elena Landau, Arminio Fraga, Alexandre Schwartsman, Sandro Cabral e Marcelo Neri lamentam forma como ministro dispensou missão do Fundo
O anúncio do fechamento do escritório do Fundo Monetário Internacional (FMI) no Brasil , feito nesta quinta-feira após críticas do ministro Paulo Guedes à entidade, foi lamentado por economistas ouvidos pelo GLOBO.
Eles criticam a posição do ministro e, em sua maioria, afirmam que haverá impacto negativo para o país em termos de credibilidade e imagem junto a mercados internacionais.
Elena Landau: 'É uma forma debochada, ridícula' de tratar FMI
A economista Elena Landau, ex-diretora de Privatizações do BNDES, critica as falas de Guedes, que na última quarta-feira disse a uma plateia de empresários que estava “dispensando” o órgão do país.
"A maneira pela qual o ministro da economia trata um órgão da importância do FMI é mais uma mancha na imagem do Brasil frente ao mundo. É uma forma debochada, ridícula", diz Landau.
A economista também condena as declarações do ministro sobre o ex-presidente do Banco Central Ilan Goldfajn, que em janeiro assumirá o cargo de diretor para o Hemisfério Ocidental do FMI.
"Ao falar do Fundo, Guedes ataca o ex-presidente do Banco Central Ilan Goldfajn, que ganhou por dois anos seguidos como melhor presidente de Banco Central do mundo. Isso mostra mais uma vez a mesquinhez do ministro da Economia, agora frente a um profissional que teve sucesso absoluto no combate da inflação", afirma Landau.
A economista se refere ao prêmio Central Banker of The Year, concedido pelo jornal Financial Times a Goldfajn.
O ex-presidente do BC tem afirmado em entrevistas e eventos recentes que prevê uma recessão para o país no próximo ano e que os investidores estrangeiros já fugiram do país.
Arminio espera reconsideração de ambos os lados
Landau ressalta, ainda, que o Brasil não resolveu seus problemas fiscais e que, embora Guedes mostre contrariedade quanto às previsões traçadas pelo FMI para a economia brasileira e não concretizadas, as estimativas do ministro também se mostraram equivocadas.
"Guedes criticou a qualidade das previsões econômicas do órgão, mas ele é a última pessoa no país que deveria criticar quaisquer previsões. Ele prometeu R$ 1 trilhão em privatizações e não entregou, previu uma recuperação econômica em V e inflação controlada. É a pessoa que mais erra projeção", conclui.
Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central e sócio da Gávea Investimentos, afirmou ao GLOBO esperar que o governo e o FMI "se entendam e voltem atrás" da decisão de encerrar o escritório.
Schwartsman: 'Atitude mostra imaturidade e despreparo'
Para Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Relações Internacionais do Banco Central do Brasil, não há repercussão econômica com o anúncio.
"A atitude do ministro mostra imaturidade e despreparo, mas o Brasil não precisa (economicamente) do Fundo nem o Fundo precisa do país, mesmo ministros ruins, como Guido Mantega, mantiveram uma boa relação com a entidade", diz ele.
Para Schwartsman, a reação de Guedes pode ter sido desencadeada por um desconforto com o fato de Goldfajn ter sido convidado para ser diretor do FMI.
"O ministro Guedes tem um problema para lidar com críticas, ele não é acostumado a ouvir outra pessoa que não a si próprio, qualquer um que tenha se reunido com ele sabe que ele faz monólogo, é impermeável à opinião alheia", diz Schwartsman.
Ele continua:
"A reação dele (contra o FMI) foi aparentemente motivada pelos comentários do Ilan, que está indo para o FMI convidado para ser diretor da entidade para o Hemisfério Ocidental, cargo mais alto que qualquer representante brasileiro já tenha atingido na instituição. Guedes tem problema para lidar com isso."
Procurado pela reportagem, Goldfajn não quis comentar as declarações de Guedes.
Schwartsman também considerou impróprias as críticas do ministro a projeções do FMI, já que Guedes também incorre com frequência em previsões frustradas:
"Guedes está brigando para ter o monopólio das previsões erradas. Em agosto ele dizia que a economia estava decolando e os dados do IBC-Br (Índice de Atividade Econômica do Banco Central-Brasil) mostram que a economia afundou. Vi um comentário nas redes sociais que é interessante. Não dá para menosprezar Guedes: ele conseguiu em três anos o que o PSTU está tentando desde a fundação, expulsar o FMI."
Sandro Cabral: 'Amplifica e reforça o isolamento internacional do país'
Para Sandro Cabral, professor do Insper, a saída do FMI é péssima e danifica ainda mais a imagem internacional do país.
"O sinal que o Fundo dá quando fecha o escritório no Brasil é muito ruim, amplifica e reforça o isolamento internacional do país e pode prejudicar grandes exportadores e empresas que busquem captar dinheiro no exterior", ressalta. Para op especialista, o discurso do ministro não leva em conta a repercussão negativa do fato.
Marcelo Neri: 'O problema não está no FMI, e sim na economia brasileira'
Marcelo Neri, professor da FGV, também avalia que as rusgas entre o governo e a instituição prejudicam a credibilidade internacional do Brasil.
"É um problema parecido ao que temos com a PEC dos Precatórios, afeta a credibilidade. Ter presença local de um órgão como o FMI, que acompanha as contas dos países ajuda a dar alguma credibilidade. Já a saída, da forma como foi, reflete um problema de relacionamento e tem uma consequência negativa", afirma.
As previsões econômicas do FMI para o Brasil, segundo Neri, estão em linha com as do mercado.
"O ministro está incomodado com as projeções do ano passado, mas as de 2021 e 2022 são muito ruins, de inflação e desemprego altos. Não são apenas as projeções do FMI, mas sim as do mercado de maneira geral. O problema não está no FMI, e sim na economia brasileira", ressalta.