Relator no TCU pede novos estudos sobre privatização da Eletrobras

Tribunal deve julgar o assunto na próxima quarta

Relator no TCU questiona pontos da privatização da Eletrobras
Foto: Fernanda Capelli
Relator no TCU questiona pontos da privatização da Eletrobras

Relator do processo de privatização da Eletrobras no Tribunal de Contas da União (TCU), o ministro Aroldo Cedraz apontará em seu voto uma série de problemas no processo, que podem representar uma dor de cabeça para os planos do governo de vender a estatal de energia no próximo ano.

A corte marcou para a próxima quarta-feira a primeira análise do processo. O voto de Cedraz será analisado pelos outros oito ministros da corte. Como o GLOBO já mostrou, porém, há uma tendência da maioria dos ministros darem aval à privatização, independentemente da análise feita por Cedraz.

No seu voto, ao qual o GLOBO teve acesso, Cedraz afirma que as informações apresentadas pelo Ministério de Minas e Energia estão incompletas, que é necessário novos estudos sobre o aproveitamento das usinas hidrelétricas da estatal, e os parâmetros dos cálculos dos contratos que serão assinados pela Eletrobras privada com o governo.

A privatização prevê o pagamento pela Eletrobras privada de R$ 23,2 bilhões para o Tesouro Nacional; R$ 8,7 bilhões em dez anos para a revitalização de bacias hidrográficas; e R$ 30 bilhões para um fundo do setor elétrico com o objetivo de amenizar as altas nas contas de luz.

Cedraz afirma que o pagamento para a revitalização das bacias hidrográficas pode ser inconstitucional. “Na prática, pelo modelo proposto, o governo desistiria de receber esses valores (sob a forma de bônus de outorga) e, em contrapartida, a nova Eletrobras assumiria o compromisso de arcar com as despesas, a serem pagas com o faturamento próprio da empresa”, afirma o voto.

Esse ponto, na verdade, tem sido visto por outros ministros do TCU como uma forma de garantir a operação e votar a favor da privatização. A Eletrobras deverá aportar recursos para a revitalização da bacia do Rio São Francisco, dos rios localizados em Minas Gerais e para a energia na Amazônia. Essas são demandas antigas de políticos locais.

Outro ponto criticado por Cedraz é a possibilidade de impacto nas contas de luz para os grandes consumidores de energia, principalmente a indústria. O governo alega que as obrigações impostas à nova Eletrobras não trariam impacto nas tarifas cobradas dos consumidores finais porque a empresa teria que recolher parte dos valores para a conta do fundo do setor elétrico.

“O problema é que esse argumento seria supostamente válido apenas para o consumidor cativo (mercado regulado), com alguns reparos, mas certamente não se aplica ao mercado de consumo livre, de indústrias e outras grandes empresas, que poderiam sofrer impacto significativo do aumento de custos imposto à Eletrobras”, diz o voto.

O governo corre contra o tempo para ter o aval da corte e conseguir fazer a operação até maio de 2022, prazo definido pelo Executivo como limite para a desestatização da maior empresa de energia da América Latina. Depois disso, a avaliação é que dificilmente seria possível fazer a operação, por conta dos prazos legais e da proximidade com o período eleitoral.

Especialistas com conhecimento no assunto avaliam, em condição de anonimato, que se o TCU fizer muitas exigências que alterem os preços da operação, a privatização pode não sair.

Depois de analisar as outorgas, o TCU ainda precisará analisar a operação em si, que ocorrerá por meio de uma capitalização. Essa análise só seria feita no próximo ano, provavelmente em fevereiro.

O modelo da privatização prevê transformar a companhia em uma corporação, sem controlador definido, após uma oferta de ações que não será acompanhada pela União. Sem acompanhar a capitalização, o governo tem sua participação diluída para menos de 50% e perde o controle das empresas.

Caso a oferta primária não seja suficiente para reduzir a participação direta e indireta da União para 45% ou menos do capital votante, poderá ser feita uma suplementação da oferta com a venda também de ações da própria União (oferta secundária).

A União deve continuar como principal acionista, mas sem controle. Nenhum acionista poderá ter direito a voto superior a 10% do capital votante.