PEC dos Precatórios pode parar na Justiça por ferir cláusula pétrea; entenda
Texto aprovado na Câmara que tramita no Senado será questionado por contrariar princípio da ‘coisa julgada’ ao adiar pagamentos determinados pelo Judiciário
O espaço no Orçamento de 2022 que o governo quer abrir com a proposta de emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios deve ser alvo de contestações judiciais no Supremo Tribunal Federal (STF), além do próprio mérito do projeto.
Ao criar um teto para o pagamento de despesas do governo federal decorrentes de decisões judiciais, na prática a PEC adia o pagamento de precatórios já expedidos.
Na proposta original do Orçamento de 2022, há R$ 89,1 bilhões destinados para o pagamento de precatórios.
A PEC faz esse valor cair para R$ 44,5 bilhões, abrindo um espaço parecido no Orçamento de 2022: R$ 44,6 bilhões. Esse dinheiro vai ser usado para pagar o Auxílio Brasil de R$ 400, bandeira que o presidente Jair Bolsonaro quer levar para 2022.
Especialistas alertam, no entanto, que adiar o pagamento de precatórios já expedidos pela Justiça contraria o princípio de coisa julgada, que é cláusula pétrea da Constituição — ou seja, que não pode ser alterado mesmo por emenda à Constituição, caso da PEC.
STF já se manifestou contra parcelamento
O STF pode julgar se emendas à Constituição ferem cláusulas pétreas e já se manifestou duas vezes contra o parcelamento de precatórios.
Para juristas, a coisa julgada decorre do esgotamento das possibilidades de recursos à decisão judicial que enfrentou a questão principal do processo.
Um precatório é expedido justamente quando esgota-se totalmente a possibilidade de o governo recorrer de uma decisão. A expedição de um precatório é considerada, inclusive, um ato administrativo, que pode ser feito por diversos juízes quando uma decisão torna-se conclusiva (após o trânsito em julgado).
"A PEC contraria a coisa julgada, que é cláusula pétrea", afirma Gustavo Binenbojm, professor titular da Faculdade de Direito da UERJ, que representa o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia (RJ) na ação no Supremo contra a tramitação da PEC.
Guedes: ‘não é calote’
O ministro da Economia, Paulo Guedes, negou ontem irregularidades na PEC :
"Evidentemente não é calote. Se está dizendo que paga à vista imediatamente dentro do teto e o que estiver fora, dar condições de quitações instantâneas, em face da quantidade de ativos que o governo tem, não vai haver fila nenhuma."
Fernando Scaff, professor titular da USP, diz que o adiamento das decisões em 2022 irá para a Justiça:
"Mudar a regra não vai mudar a obrigação de pagar. Qualquer pedalada dessa PEC não atingirá os precatórios já expedidos."