INSS: não é preciso ter sido contribuinte para receber BPC/LOAS; veja critérios
Especialista explica quais são os requisitos para conseguir o Benefício de Prestação Continuada (BPC), previsto na Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS)
O Benefício de Prestação Continuada (BPC), previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), é um dos benefícios que mais geram dúvidas na população sobre quem tem ou não o direito sobre ele - principalmente, porque não é necessário ter contribuído com a Previdência Social para recebê-lo. Mas afinal, como de fato funciona o BPC/LOAS? Como saber se eu posso ter acesso a ele?
O que é o BPC/LOAS?
O BPC/LOAS é um benefício de um salário mínimo (R$ 1.100) por mês, sem o 13º salário, que é concedido para pessoas idosas, com mais de 65 anos, ou com deficiência ou incapacidade de longa duração, que possuam renda familiar de até ¼ do salário mínimo por pessoa.
"O BPC é de responsabilidade da União Federal. Às vezes, as pessoas confundem o INSS com assistência social, mas ele é apenas um órgão que vai pagar o benefício. Em tese, é mais ou menos assim: o INSS paga e recebe um reembolso da União pelo pagamento", explica o advogado especialista em Previdência Social, Hilário Bocchi.
"O Benefício de Prestação Continuada é de natureza assistencial. Enquanto a previdência é só para quem paga (se você não paga, não tem o direito aos benefícios), a assistência social é “uma ajuda do Estado” para pessoas que estão em situação de vulnerabilidade. Por isso, para receber o BPC, as pessoas têm que provar que não têm condições de se manter, e que a família também não tem condições de manter essas pessoas", afirma Bocchi.
Algumas doenças também servem como critérios para receber o BPC/LOAS?
Sim. Todas as doenças dão direito ao BPC/LOAS. "Você vai ver, por exemplo, pessoas que são soropositivas e podem/têm condições de trabalhar. Elas não vão passar pela perícia médica, porque estão aptas para o trabalho. Também tem outros soropositivos que não conseguem trabalhar, porque, além da condição, enfrentam preconceitos durante a contratação. Então, a Justiça já tem decisões dizendo que existe uma discriminação social, e isso impede que a pessoa consiga trabalhar. Pega, por exemplo, uma mulher que tem um câncer de mama sob controle e está empregada. Se ela tem renda, não pode ter direito ao BPC/LOAS. Mas se ela não tivesse e não conseguisse trabalhar, poderia. Então, a gente está dizendo que o requisito da lei é uma incapacidade ou deficiência de longa duração. Qual o tipo da doença ou da lesão? Não importa", diz o advogado.
É possível que mais de uma pessoa de uma mesma família receba o BPC/LOAS? Se alguém da minha família recebe outro benefício do INSS, mesmo assim, eu posso tentar o requerimento do BPC?
O Estatuto do Idoso diz que, se tiver duas pessoas que recebem benefícios, a renda de um não é computada para a apuração da renda do outro. A mesma coisa acontece com o Estatuto da Pessoa com Deficiência. "Então, o sinal que a gente pode dar para a sociedade é que, se houver uma decisão negativa de benefício em razão de ter mais alguém na família recebendo, pode desconfiar. É para analisar porque existem situações, e em muitas delas, pode sim", alerta Hilário Bocchi.
Como posso me cadastrar para receber o BPC/LOAS?
Para ter acesso ao BPC/LOAS, primeiro, é necessário se inscrever no Cadastro Único (CadÚnico), do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) mais próximo. O CadÚnico é um intrumento de coleta de informações para identificar todas as famílias de baixa renda existentes no Brasil.
"No CRAS, o assistente social vai falar 'essa pessoa não tem renda, tem uma incapacidade de longa duração (de acordo com registros médicos) ou é idosa, não tem condições de trabalhar, paga aluguel e despesas, tem uma pessoa na família que tem renda, porém essa renda com todas as despesas que tem no dia a dia, acaba sendo insuficiente, e precisa da ajuda do Estado. Isso tudo tem que estar no estudo social", diz o advogado.
Em seguida, após a incrição no CadÚnico, o interessado pode solicitar o benefício pelo site ou aplicativo "Meu INSS" ou pelo telefone 135. Para isso, é necessário comprovar a idade, por meio de documentos, ou a deficiência ou incapacidade de longa duração, por meio de laudos médicos.
E se mesmo atendendo a todos os requisitos, o meu benefício for negado?
"Podemos elencar dois motivos que geram a negativa do benefício. Um deles é a perícia médica. Muitas pessoas não passam pela perícia médica, embora estejam incapacitadas. O segundo motivo é a questão da renda, porque o INSS faz uma avaliação muito superficial do que é renda. Não abate, embora a Justiça determine, as depesas com alimentação ou vestuário especial (como fralda geriátrica) e os custos médicos. Isso tudo tem que ser descontado, porque, às vezes, a pessoa ultrapassa a renda, mas tem todos esses gastos necessários para cuidar do idoso ou da pessoa com incapacibilidade ou deficiência e acaba caindo dentro do patamar de ¼ do salário mínimo - que é o limite para a concessão do BPC", explica Hilário Bocchi.
"Se o INSS não concede o benefício, a pessoa tem dois caminhos: entrar com recursos na própria Previdência ou acionar a Justiça. Existe uma estatística do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dizendo que pelo menos 11% dos benefícios mantidos pela Previdência Social foram concedidos por ordem judicial. Então, a gente sabe que muitas pessoas conseguem esses benefícios na Justiça, justamente, porque os critérios de avaliação da Previdência não são tão eficazes.", continua ele.
Novas regras
Em junho, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou a Lei 14.176/2021 , que altera regras para concessão do BPC/LOAS. A medida reduziu de ½ salário-mínimo para até ¼ do salário mínimo a renda mensal per capita máxima necessária para ter acesso ao benefício. "Na prática, isso não muda nada", afirma o especialista.
"Vamos pegar, por exemplo, uma latinha de feijoada que vence no dia 31 de dezembro de 2021. No dia 1 de janeiro de 2022, ela vai deixar de poder ser consumida? Não. Então, nós estamos falando de um parâmetro. É uma base para a gente colocar aquelas pessoas que, entre aspas, estão dentro de uma condição de vulnerabilidade social", continua Bocchi.
"É claro que isso tem que ser observado, mas não ao pé da letra, de forma rígida. Então, na prática, isso não muda nada, apenas a forma de interpretação. Mas a forma de interpretação está avaliada por um valor e não por um princípio. Qual que é o valor? A pessoa que está em vulnerabilidade social. 'Ah, mas a renda per capita é maior que o ¼'. Sim, mas a situação que ela está vivendo não permite que ela consiga viver apenas com isso? Então, essa é a grande discussão", finalizou.
Outra mudança em relação ao benefício começa a valer a partir da próxima semana, no dia 1º de outubro. É o chamado "auxílio-inclusão" . Hoje, os beneficiários que conseguem um emprego formal (com carteira assinada) perdem o direito ao BPC/LOAS. Com a mudança, se acharem um emprego, em vez de receber o valor integral, de R$ 1.100, recebem metade (R$ 550).
** Gabrielle Gonçalves é jornalista em formação pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Estagiária em Brasil Econômico. No iG desde agosto de 2021, tem experiência em redação e em radiojornalismo, com passagens pela Rádio Unesp FM e Rádio Metropolitana 98.5 FM.