Após falas de Bolsonaro, Congresso poderá travar agenda econômica
Líderes governistas reconhecem a necessidade de recompor a base e um esforço concentrado para tentar aprovar projetos
A radicalização do discurso do presidente Jair Bolsonaro no 7 de Setembro criou dificuldades extras para a agenda econômica do governo no Congresso. Líderes governistas reconhecem que a janela de oportunidade para a aprovação destas pautas já era desafiadora – cerca de dois meses – e indicam a necessidade de uma nova estratégia.
Na lista prioritária da Economia estão projetos como Orçamento, Auxílio Brasil, privatização dos Correios, PEC dos Precatórios e as reformas administrativa e tributária, consideradas fundamentais e de difícil consenso entre os parlamentares.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pediu um basta à escalada da crise e se ofereceu como mediador dos conflitos entre Executivo e Judiciário. O deputado dá sinais de que seguirá tocando sua agenda no legislativo, mas líderes governistas admitiram, de forma reservada, que a radicalização do discurso de Bolsonaro trará problemas para o governo.
Legendas consideradas de centro e mais independentes – como MDB e PSDB, DEM, além do PSL– se manifestaram contra o discurso do presidente. A tendência é que esses partidos não colaborem nas votações, se somando à oposição.
A equipe econômica já se ressentia, antes do 7 de Setembro, da morosidade de algumas pautas, como o Auxílio Brasil e a PEC dos Precatórios, além de ver projetos como a MP da minirreforma trabalhista ser rejeitada pelo Senado. E mesmo projetos que avançaram de forma célere, como a reforma do Imposto de Renda, passaram por muitas mudanças, descaracterizando as propostas do governo.
Agora a avaliação é de que poderá ser necessário abrir mão de ainda mais detalhes importantes para os textos terem chance de serem aprovados. No entanto, interlocutores afirmam que ainda é preciso esperar alguns dias para dimensionar corretamente o impacto dessas falas do presidente.
O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), disse que o Executivo tem prazo máximo de 60 dias para aprovar os projetos de seu interesse no Legislativo por causa da proximidade do calendário eleitoral. Ele defendeu um esforço concentrado da articulação política nesse período e necessidade de recompor a base de apoio no Senado, que tem segurado ou votado contra as pautas do governo.
Gomes admitiu que as falas do presidente Jair Bolsonaro no ato de 7 de setembro causaram incômodo entre os parlamentares. Mas argumentou que o melhor caminho é a busca do entendimento, porque há uma necessidade urgente de recuperação da economia, geração de empregos e combate à inflação.
"Temos que fazer um esforço concentrado nos próximos 60 dias para votar as pautas prioritárias para o país. A janela de oportunidade está se fechando", disse Gomes ao GLOBO.
Ele alertou que o clima no Senado exige atenção especial do governo com as lideranças da Casa, inclusive de partidos da oposição para priorizar projetos de interesse comum. Gomes disse que a ida do senador Ciro Nogueira (PP-PI) para o comando da Casa Civil ainda não surtiu efeito no resultado das votações porque ele ainda está no início dos trabalhos.
O líder do governo da Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), assegurou que os deputados continuam dispostos a votar as reformas, mas ponderou que elas param no Senado:
"A Câmara vai entregar os projetos dentro do prazo. O problema é o Senado", disse Barros.
Um dos exemplos foi a aprovação da reforma do Imposto de Renda (IR) na semana passada. O texto foi enviado ao Senado, onde já enfrenta resistências.
Líderes dos partidos na Câmara também defendem que Casa tenha serenidade e continue votando a pauta econômica, apesar dos abalos da fala de Bolsonaro na base de apoio.
"É preciso ter serenidade para separar os temas. A agenda econômica é importante para o Brasil, não é pauta de só de governo", disse Efraim Filho (DEM-PB).
Esse argumento foi reforçado pelo líder do MDB, deputado Isnaldo Bulhões Jr (AL).
"É preciso ter calma. Quem defende o equilíbrio não pode botar fogo no debate. Não vejo espaço para abertura de impeachment porque praticamente já entramos no ano eleitoral".
Apesar do apelo social, a medida provisória (MP), que cria o Auxílio Brasil deve encontrar dificuldades na tramitação por causa do curto espaço de tempo e da falta de recursos para financiar o novo programa do governo. Líderes também apontam dificuldades na aprovação da reforma administrativa, apesar das concessões feitas pelo relator Arthur Maia (DEM-BA).
Outro tema sem solução é a Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que prevê o parcelamento do pagamento de precatórios, decisões judiciais em até 10 anos. A despesa deve consumir R$ 89 bilhões do Orçamento da União em 2022.