Ajustes fiscais na PEC do auxílio perdem força e podem travar na Câmara
Equipe econômica e Lira entraram em cena para demover presidente da República da ideia. Relator diz que vai manter texto aprovado no Senado, com regras mais duras
Um dia após ser defendida pelo presidente Jair Bolsonaro , a proposta de flexibilizar o ajuste fiscal previsto na proposta de emenda à Constituição (PEC) que recria o auxílio emergencial chegou a ser discutida por líderes da Câmara na manhã desta terça-feira (09), mas perdeu força ao longo do dia.
O movimento para manter regras mais duras, já aprovadas no Senado, ocorreu após reação nos bastidores da equipe econômica e de declarações de parlamentares preocupados com o efeito que a desidratação do projeto causaria nos juros e na inflação. A PEC deve ser votada nesta semana na Câmara.
O plano em estudo, ainda não descartado, é retirar do texto trecho que prevê que servidores terão o direito à promoção por tempo de serviço suspenso em caso de crise fiscal. O objetivo da medida é preservar especificamente profissionais da área de segurança, como policiais.
O assunto foi discutido nesta terça em reunião na residência oficial do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL. Preocupados, Lira e o relator da PEC Emergencial, Daniel Freitas (PSL-SC), foram ao Palácio do Planalto para conversar com o presidente da República. O líder do PSL, Vitor Hugo (GO), participou da reunião.
Relator diz que vai manter texto mais rígido
Após o encontro, Freitas disse que seu relatório contemplará o mesmo texto do Senado. Ele argumentou que qualquer mudança prejudicaria "a camada mais pobre da população". Dependendo do tipo de emenda, alterações na PEC podem atrasar a tramitação da proposta, com o retorno do texto ao Senado, o que adiaria o pagamento do auxílio emergencial.
"As corporações gostariam de ser incluídas no texto, mas não podemos pensar que vamos atrasar a entrega do texto", disse Daniel Freitas.
Perguntado se algum partido apresentaria emendas para garantir a promoção a servidores, ele disse não ter ciência da movimentação. Apenas afimou que esse é um direito das legendas.
O parlamentar confirmou ainda a intenção de Bolsonaro, até o último momento, de contemplar servidores da área de segurança.
"O presidente Bolsonaro queria ver (o atendimento) à segurança pública neste momento, mas nós entendemos que agora o plenário da Câmara é soberano. E nós vamos levar à apreciação dos deputados. O meu relatório vai neste sentido", ressaltou Freitas.
Com a decisão do relator, qualquer alteração no texto depende da apresentação de emendas em plenário, que seriam votadas separadamente após a aprovação do texto principal.
Maioria da base quer manter o texto, diz Lira
Mais tarde, Arthur Lira indicou que a tendência da Câmara é manter o texto aprovado no Senado disse que a intenção da maioria dos deputados é aprovar o texto original do Senado.
Ele prevê votação da constitucionalidade da PEC ainda nesta terça-feira. Na quarta, os deputados votariam em primeiro e segundo turno a proposta. Sobre a possibilidade de atender servidores, admitiu que pode ocorrer apresentação de destaques ou emendas neste sentido.
"São situações que merecem discussão, podem merecer ou não destaques e emendas, mas a maioria esmagadora da base decidiu que o melhor será, por todo o momento que o Brasil vive, (manter o texto). A perspectiva e previsões de votações na Casa têm que ser claras. E o auxílio é importante para todos", afirmou.
Lira acrescentou que a discussão do mérito está "organizada". Afirmou ainda que o relator fará "poucas ou nenhuma alteração" na PEC.
"Vamos para o plenário e, lógico, haverá uma discussão mais ampla, democrática, partidária, de quem concorda ou não, de temas que serão discutidos", disse Lira.
Sobre a reunião com Bolsonaro, Lira disse que o presidente recebeu bem a intenção de não dar preferência aos servidores.
"(Bolsonaro recebeu) muito bem, sereno. E sabe que a PEC tem origem no legislativo, de um senador, será votada na Câmara e promulgada pelo Congresso. Então, será uma decisão qualificada pelo Congresso Nacional.", concluiu.
Nas redes sociais, o vice-presidente da Câmara, deputado Marcelo Ramos (PP-AM
Integrante da bancada da bala, Capitão Augusto (PL-SP) disse que terá dificuldades de apresentar emenda à PEC caso o presidente Jair Bolsonaro não se posicione sobre o assunto e oriente sua base. Ele é autor de emenda que privilegia profissionais de segurança.
"Nós não desistimos ainda. Mas estamos vendo que, sem o aval do governo, nós não vamos conseguir nem as assinaturas, quiçá aprovar essa emenda. Então, a base do governo, os parlamentares, estão aguardando orientação do próprio governo. Se o governo não der o aval, nós não vamos conseguir sequer apresentar essa emenda", disse Capitão Augusto
O que diz a PEC
Como aprovada no Senado, a PEC prevê a possibilidade de acionar medidas como congelamento de salários e proibição de concursos públicos caso União, estados ou municípios entrem no chamado estado de emergência fiscal, quando as despesas crescerem acima de um patamar específico.
As ações de controle incluem a proibição de reajuste salarial, vedação de concursos públicos e criação de qualquer outro tipo de despesa obrigatória, como concessão de bônus ou auxílios ao funcionalismo.
O que está em negociação é retirar da proposta a proibição às progressões e promoção de carreira — reajustes automáticos que ocorrem periodicamente. Outras travas, como bloqueio de reajustes concedidos voluntariamente, continuariam proibidos em caso de crise fiscal.
Outro ponto em discussão pelos líderes é a retirada do artigo que obriga Bolsonaro a encaminhar um projeto ao Congresso para rever benefícios fiscais.
A avaliação, nesse caso, é que essa discussão deve ficar para quando a reforma tributária entrar em pauta, o que ainda não tem previsão de acontecer.
Equipe econômica reage
Nos bastidores, a movimentação de Bolsonaro e de Vitor Hugo é acompanhada com apreensão. Segundo fontes, auxiliares do ministro da Economia, Paulo Guedes, entraram em cena para garantir que a proposta seja aprovada conforme foi aprovada no Senado.
De acordo com integrantes da equipe, Guedes recebeu o apoio do ministro da Secretaria-geral de Governo, Luiz Eduardo Ramos, que teria entendido que a sinalização ao mercado seria ruim, caso a PEC seja desidratada.
A avaliação no time da Economia é que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que permitiu que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltasse a ser elegível tende a fazer com que Bolsonaro intensifique a busca de apoio entre aliados de primeira hora, como militares.
Durante a reunião, técnicos que acompanham as negociações no Legislativo alertavam ainda que uma das possibilidades em discussão seria aprovar o texto original do Senado e incluir as mudanças exigidas pela bancada da bala em uma nova proposta, chamada de PEC paralela.
Nessa estratégia, o projeto com regras mais duras e a autorização para o auxílio seria promulgado e caberia aos parlamentares interessados na flexibilização mobilizar o Congresso para promover mudanças.
A alternativa seria uma redução de danos ao governo e tende a desagradar parlamentares que defendem que a proposta seja aprovada já com regras mais brandas.
Bolsonaro anunciou mudança
Em entrevista na tarde de segunda-feira, ao falar com jornalistas na saída do Palácio do Planalto, Bolsonaro afirmou que a bancada da segurança na Câmara está insatisfeita com o texto da PEC.
"A bancada da segurança queria mudanças, ela tem mais ou menos 50 parlamentares. Conversei com relator e com o Arthur Lira e, da minha parte, falei com o relator que ele poderia correr o risco de não aprovar, se não mexesse em três artigos. Eram cinco, reduzimos para três, buscando negociação", afirmou Bolsonaro.
O início da discussão da PEC em plenário estava marcada para as 10h desta terça-feira. Com o impasse, houve atraso.