Brasil cria mais vagas, mas taxa desemprego aumenta; entenda por quê
Mesmo que dados indiquem recuperação, especialistas alertam para diferenças
Por Brasil Econômico |
29/12/2020 17:37:49
De acordo com dados do IBGE , o desemprego aumentou no trimestre de agosto a outubro, chegando a atingir 14,1 milhões de brasileiros. Entretanto, segundo o Ministério da Economia divulgou na última semana, o mês de novembro foi o quinto consecutivo de abertura de vagas com carteira assinada. Dessa forma, o Brasil chegou num saldo positivo desde o início da pandemia.
Embora as informações possam parecer contraditórias, especialistas afirmam que não são. Isso ocorre pois, embora haja um saldo positivo nos postos de trabalho com carteira assinada, o número de empregos criados segue sendo menor do que a quantidade de pessoas procurando por trabalho.
Outro fator que contribui para isso é o aumento na quantidade de pessoas procurando trabalho, o que aumenta as taxas de desemprego.
De acordo com o economista Daniel Duque, pesquisador do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), procurado pelo UOL, o Brasil de fato tem passado por um período de aumento do emprego com carteira, que é registrado tanto pelo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério da Economia, quanto pela Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, do IBGE, mesmo que essas duas pesquisas possuam metodologias diferentes.
Vale lembrar que, para ser considerada desempregada pelo IBGE, uma pessoa não só necessita estar sem emprego, mas também ter procurado por alguma vaga no período que precede a pesquisa.
Caso uma pessoa esteja sem emprego, mas também não buscou trabalho, não é tida como desocupada pelo IBGE, que considera tanto empregos com carteira assinada ou empregos informais .
Basicamente, como explicado anteriormente, o desemprego aumenta quando o número de vagas abertas , somando as com carteira assinada e as sem, não é o suficiente para empregar a quantidade de pessoas desempregadas que buscam o reingresso no mercado de trabalho .
Essa deficiência no número de vagas não ocorre somente porque pessoas perderam seus empregos ou menos vagas estão abertas, mas também porque outras pessoas que não estavam procurando trabalho passaram a procurar.
A economista Solange Gonçalves, professora do Departamento de Economia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), procurada pelo UOL, explicou essa relação.
“O desemprego vai inflando por causa desses dois movimentos: a perda de emprego das pessoas, mas também a saída das pessoas da inatividade ”.
De acordo com Solange, o número de pessoas inativas, sem buscar emprego, já tinha crescido em anos recentes, por causa da crise econômica.
Porém, na pandemia, o movimento aumentou, pois muitas pessoas desistiram de procurar emprego, devido à baixa chance de sucesso, ou por causa das orientações de distanciamento social .
O pesquisador da FGV, Daniel Duque, afirma que esse movimento dos primeiros meses da pandemia levou a um " desemprego oculto ", um desemprego que não era visto nas estatísticas.
“(Agora) a gente está vendo o efeito contrário, o desemprego oculto está se revelando, porque as pessoas que tinham deixado de procurar emprego estão voltando a fazê-lo”.
Visão do Governo
O governo Jair Bolsonaro (sem partido) tem celebrado os dados de criação de emprego com carteira assinada registrados pelo Caged. De acordo com o governo, essa alta é fruto das medidas de combate à Covid-19 e um sinal de que a economia está retomando.
Caso o Brasil termine o ano com saldo positivo, uma campanha publicitária exaltando os números deve ser feita.
Daniel Duque observa que, de fato, os números indicam que está havendo alguma melhora no mercado de trabalho. Porém, para ele, o Caged, do Ministério da Economia, está descolado dos demais indicadores.
"Que está havendo alguma recuperação, alguma melhora na situação mercado de trabalho, não tem como negar. No entanto, os dados do Caged estão um pouco descolados dos demais [dados] da atividade econômica", explica. "O número de admissões, por exemplo, está 19% maior do que em novembro do ano passado. É um pouco estranho, porque isso significaria que a gente está em um nível de atividade bastante acima do nível de 2019, o que não é verdade."
Duque acredita que esse descolamento pode ser consequência de mudanças feitas pelo governo no Caged, que passaram a valer no começo de 2020.
Para parte das empresas, o sistema eSocial passou a substituir a obrigação de prestar informações via Caged.
"Resta a hipótese de que realmente houve uma quebra estrutural entre o novo Caged e o anterior. Pode ser que essa nova série tenha números sempre bem melhores do que os da antiga", afirma Duque.
Mesmo com os resultados, Solange Gonçalves considera que ainda é cedo para dizer que a economia está em recuperação, analisando dados de emprego.
Ela afirma que, até o momento, poucos setores estão mostrando sinais de recuperação, além de destacar que não se deve ignorar a ameaça de uma nova paralisação de atividades com o crescimento de casos de covid-19 no país.
Ainda de cordo com ela, o aumento de emprego tem sido, principalmente, das vagas sem carteira assinada.
"O que a gente observa é uma criação de emprego informal mais forte, que muitas vezes é uma falta de opção e não exatamente um emprego que a gente possa comemorar", disse.