Mercado 'abandona' Bolsonaro e dívida pública de curto prazo atinge R$ 1 trilhão
Intenção de aumentar gastos públicos e falta de direção da economia levam investidores a cobrar prêmio do Tesouro e 'fugir'; entenda
Por Brasil Econômico |
05/10/2020 15:59:17
Diante das incertezas provocadas pela pandemia e a falta de direcionamento do governo em relação à economia, o mercado financeiro foge do Brasil e abandona o governo de Jair Bolsonaro. A intenção do presidente de aumentar gastos públicos e a falta de clareza de ideias quanto ao financiamento do Renda Cidadã
, por exemplo, acentuam tendência dos últimos meses e contribuem para que a dívida pública de curto prazo - os vencimentos em doze meses - passe de R$ 553 bilhões para R$ 1,02 trilhão, de acordo com levantamento da Folha de S.Paulo
.
O prazo médio dos títulos da dívida pública brasileira emitidos desde o começo deste ano caiu a mais da metade, passando de 4,7 anos para 2,4 anos. Na prática, isso indica que os investidores não acreditam que o Brasil será capaz de honrar com seus compromissos.
Além do vencimento mais curto, a desconfiança do mercado financeiro com o governo Bolsonaro também é refletida nos juros pagos pela União, que vêm aumentando em 2020.
Com a taxa básica de juros, a Selic , fixada em 2% ao ano pelo Banco Central , o Tesouro Nacional tem de pagar mais que o dobro disso para vender títulos da dívida com vencimento daqui a dois anos. Em dívidas mais longas, quando há mais tempo para pagar, os juros sobem e sobem mensalmente. Para os papéis de 10 anos, segundo a Folha , os investidores já exigem taxas que beiram os 9%.
Para controlar a dívida, o governo tem buscado evitar os papéis de longo prazo, o que fez a dívida de curto prazo, com vencimento em um ano, superar a marca de R$ 1 trilhão.
A expectativa é que, ao final de 2020, a dívida pública atinja 95% do Produto Interno Bruto (PIB), com o Brasil chegando a um nível recorde de endividamento.
A alta dos juros e o crescente endividamento ajudam a explicar a alta do dólar . Com a economia brasileira em frangalhos, sem direcionamento e flertando com o aumento dos gastos, os investidores fogem do Brasil e se protegem comprando dólares. Em 2020, a moeda norte-americana já acumula alta de cerca de 40% e, atualmente, o Real é a moeda que mais se desvaloriza no mundo.
Na última semana, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse que o governo precisa respeitar o teto de gastos , caso contrário, os juros poderão voltar a subir no país. A discussão do governo entre os que defendem mais investimentos públicos e os que cobram equilíbrio fiscal acima de tudo já gera desgaste entre o ministro da Economia, Paulo Guedes, e outros ministros, como Rogério Marinho, do Desenvolvimento Regional.
Também na semana passada, após rumores de ataques e novas disputas públicas entre os dois, Guedes engrossou o discurso e disse que se Marinho falou mal dele é "despreparado, desleal e fura-teto" . Os dois já haviam se enfrentado publicamente meses atrás, durante a discussão do plano Pró-Brasil, que teria investimentos em obras públicas. À época, Bolsonaro saiu em defesa de Guedes e disse que ele é "quem manda" na economia .
Os embates do governo, as ameaças ao teto de gastos e o crescente endividamento se somam aos problemas políticos e afastam os investidores de Bolsonaro, que em outros tempos foi muito carregado pelos bons sinais da economia aos olhos do mercado. Com dívida subindo, maior dificuldade na retomada e o fim dos programas emergenciais, a popularidade e os apoios do presidente podem correr risco.