Sem aglomeração: Justiça proíbe reunião de mil pessoas em condomínio de luxo

Insatisfeitos com o agendamento de uma reunião considerada “não urgente” em meio à pandemia da Covid-19, moradores acionaram a Justiça

Condomínio de luxo no litoral norte de São Paulo
Foto: Foto: Reprodução/Internet
Condomínio de luxo no litoral norte de São Paulo

O Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu uma assembleia presencial em um condomínio de luxo que reuniria cerca de 1.000 pessoas. Insatisfeitos com o agendamento de uma reunião considerada “não urgente” em meio à pandemia da Covid-19, moradores acionaram a Justiça para a suspensão do encontro. O Condomínio Costa Verde Tabatinga fica localizado no município de Caraguatatuba, no litoral norte do estado.

Em entrevista ao iG, o advogado à frente do caso, Vinícius Zwarg, do escritório Emerenciano, Baggio e Associados – Advogados, contou que o condomínio, de 1.000 lotes, é dividido em 12 subcondomínios e a reunião geraria grande aglomeração entre os presentes, já que o quórum qualificado envolveria 750 pessoas. Ele destaca que a assembleia não foi agendada com antecedência, conforme regras estabelecidas, e os temas listados não eram urgentes.

“O objeto da pauta desta reunião era extremamente controverso, na medida que tratava de mudanças estruturais do condomínio. A legislação diz que quando vamos falar sobre algo estrutural que fere a Convenção Condominial, há necessidade de um quórum qualificado, que nas regras deste local são de 75% das pessoas presentes. Isso é um problema, ter que deslocar esses condôminos, muitas deles idosos”, justifica.

Entre os temas a serem deliberados, caso a reunião tivesse ocorrido, estavam a adequação do rateio das despesas do condomínio, realização de obras e a alteração da Convenção. Um outro ponto questionado pelos moradores é que o imóvel está situado em uma área de praia e muitos não moram lá, sendo necessário, em meio à pandemia, viajar até o local para participar da assembleia. 

No Brasil, de acordo com a Lei 14.010/2020, as reuniões dos condomínios, em caráter emergencial, devem ocorrer em ambiente virtual até 30 de outubro, por causa da pandemia da Covid-19. Mas, no dia 20 de julho, os condôminos foram convocado pela condomínio, via e-mail, para a realização de uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE) obrigatoriamente presencial a se realizar no dia 22 de agosto.

"A convocação tem por finalidade deliberar sobre questões absolutamente irrelevantes, controversas e obscuras, inclusive objeto de assembleias já convocadas para tais fins, no entanto, canceladas em razão de grande parte das questões, exigirem quórum qualificado para sua aprovação (3/4 conforme estabelecido em Convenção)”, diz trecho do processo movido pelos moradores.

Para o advogado Vinícius Zwarg, a juíza Marta Andrea Matos Marinho, da 2ª Vara da Comarca de Caraguatatuba, acertou em sua decisão de suspender a assembleia. “Ela levou em consideração a aglomeração das pessoas e de que não é o momento para isso, já que boa parte das pautas que seriam debatidas no dia são para justamente alterar a Convenção do condomínio”, explica.

“(...) verifica-se estarem pautadas ali questões de alta complexidade, que carecerem de submissão a quoruns expressivos de discussão e votação, e que igualmente não aparentam veicular pleitos emergenciais a justificar a designação do ato extraordinário de forma presencial, considerando a Pandemia de Covid-19 que está em curso no país”, trecho retirado da decisão do TJSP.

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Procurada pela reportagem para comentar o caso, a administração do condomínio não se manifestou.

Solução pode estar no ambiente virtual

Adonilson Franco, advogado e presidente da Associação dos Condomínios Residenciais e Comerciais (Acresce), argumenta que a Justiça foi correta ao suspender a assembleia que reuniria 1.000 pessoas, assim como a iniciativa do morador de recorrer ao judiciário.

Franco explica que com a proibição das reuniões presenciais, o caminho mais seguro são os encontros virtuais, por meio do celular, computador ou outros dispositivos eletrônicos.

Se por um lado nos encontros presenciais uma pessoa é designada para realizar as anotações do encontro, no ambiente on-line tudo pode ficar gravado. É o que argumenta o presidente da Acresce. "Presencialmente, muitos temas são tratados e nem tudo fica registrado na ata da assembleia porque em muitos casos, há uma interpretação do responsável por tomar as notas. Mas, quando existe a gravação é muito diferente, até pela facilidade do acesso ao que foi citado. Traz mais segurança para todos", destaca. 

Com a pandemia da Covid-19, o processo de mudança para o mundo digital ganhou força. Para ele, as assembleias presenciais devem desaparecer com o tempo. "Por uma razão muito simples de entender. Com exceção de temas de muito interesse, como vagas em garagem, a participação na reunião presencial oscila fica em torno de 20%, quando muito. Já on-line, o percentual sobe para 65% na média. Isso porque a pessoa está no conforto de sua casa, pode dar a sua opinião e tudo fica registrado na gravação", pontua Adonilson Franco.

Existem algumas modalidades de assembleia digital, que podem variar de uma administradora para outra. Pode ser realizada ao vivo, como uma live, em tempo real ou pode ser digital, com duração de mais de um dia, com prazo maior para deliberar e debater os temas. 

De olho nas mudanças e no desafio dessa alfabetização digital, principalmente dos mais idosos, a Acresce desenvolveu uma aplicativo que o usuário paga um valor mensal apenas de custo, cerca de R$ 1,99 por mês. Na plataforma, as assembleias virtuais podem ser realizadas, a reserva de áreas comuns, a liberação de visitas e outros pontos. "A gente sabe que a vida condominial não pode parar e sabemos que os encontros presenciais não poderão ocorrer por um bom tempo, por isso é importante iniciar essa transição ao caminho virtual", conclui o presidente da Acresce.