Funcionários da Caixa assinam termo de voluntariado e são obrigados a trabalhar
Por ordem dos gestores das agências, funcionários tiveram se oferecer em Ação Especial de Atendimento, burlando norma
Por Brasil Econômico | | Letícia Sé |
Nesta sexta-feira (29), trabalhadores da Caixa Econômica Federal tiveram de assinar um tipo de termo de voluntariado para trabalharem neste sábado (30). O banco anunciou nesta semana que abriria 2.213 agências no sábado para realizar o início do pagamento em espécie da segunda parcela do auxílio emergencial.
Sob orientações dos gestores das agências, funcionários tiveram de assinar o documento virtual com caráter de voluntarismo para comparecer ao trabalho no primeiro dia do fim de semana. Isso porque, segundo as normas que regulam o funcionalismo da Caixa, seus trabalhadores não podem ser convocados a trabalhar nesse dia.
"Não poderíamos trabalhar aos sábados, não podemos ser convocados. Então eles colocam como se fosse um convite e que aceitamos voluntariamente ", disse um funcionário que não quis se identificar. Os concursos de admissão na Caixa prevêem que as jornadas de trabalho são de segunda a sexta-feira.
Há um sistema interno no banco, chamado "Quero Atender Caixa", em que os funcionários se voluntariam aos atendimentos para além de seus dias convencionais de trabalho – como se o funcionário estivesse se colocando à disposição do banco. Foi dentro desse sistema que o documento de voluntariado teve de ser assinado pelos funcionários.
Imagens do sistema foram obtidas com exclusividade pelo iG. Na primeira tela do "Quero Atender Caixa", um trecho diz:
"Para oferecer este cuidado, a Ação Especial de Atendimento possibilitará a atuação de todos os empregados da Caixa (...) É um compromisso dos empregados trabalhando pelo próximo. Para participar, basta clicar no botão abaixo – QUEROATENDER", que indica o caráter de voluntarismo do funcionário, apesar de ter sido orientado a fazê-lo.
A próxima tela indica um agradecimento do sistema da Caixa pelo registro de voluntariado. "Você poderá atuar de forma contingencial em qualquer agência de sua região metropolitana (...) Registre sua intenção (...) em participar da Ação Especial de Atendimento", diz o sistema.
O funcionário explicou o caráter do uso do sistema nesta sexta-feira (29). "A Caixa agradece a disponibilidade, o que sugere mais uma vez que o funcionário não está sendo coagido, mas sim se disponibilizando voluntariamente".
Esse uso do sistema Ação Especial de Atendimento burla a norma que proíbe o trabalho aos sábados.
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Revezamento de funcionários: "Estamos chegando ao limite"
O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, tem citado a reorganização do calendário de pagamento do auxílio emergencial , as melhorias dos aplicativos da Caixa e a parceria com prefeituras como ações que protegem os funcionários, além da distribuição de equipamentos de proteção individual.
Mas a fonte ouvida pelo iG citou uma medida não divulgada pelo banco: um esquema de revezamento de funcionários.
Para minimizar os riscos de contágio pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2) tanto no deslocamento quanto nas agências, haveria uma divisão nas equipes de atendimento.
Uma equipe trabalharia uma semana e ficaria uma semana em casa, numa espécie de "quarentena" para descanso e observar a saúde e os possíveis sintomas de Covid-19.
Porém, o revezamento tem falhado. "O revezamento proposto inicialmente pela Caixa não está sendo cumprido corretamente por falha de gestão da própria Caixa. Tem gente que não está revezando, tem revezamento sendo mal feito. Nosso risco exposição vem aumentando, e não diminuindo", disse a fonte.
Segundo o funcionário, vários colegas estão afastados por fazerem parte dos grupos de risco da Covid-19 e há uma sobrecarga nos que continuam atuando. "É uma reclamação geral dos funcionários. Estamos chegando ao limite", afirma.
Além disso, há relatos de funcionários que antes da pandemia usavam mais de um transporte público para chegar à agência e agora dormem na casa de amigos, endereços mais próximos aos bancos, para diminuir o risco de infecção nos ônibus e metrôs.
"A Caixa tem total condição de fazer um mapeamento por zona de moradia e tentar adequar, por exemplo, que os funcionários fiquem a uma distância mínima de suas residências neste momento, com uma redistribuição de mão de obra, de maneira que os funcionários cumpram o revezamento", afirmou o funcionário.
"Enquanto isso, tinha colega que morava ao lado da agência que estava com falta de pessoal e que nem ficou sabendo que precisavam de gente. Se soubesse, teria ido, porque para ele seria vantajoso evitar o transporte. No meu caso, pego dois ônibus para ir para a agência e há pelo menos duas a que eu poderia ir a pé da minha casa."
Procurada por três vezes pelo iG sobre a medida de revezamento, números de funcionários e baixas por motivos de saúde, a assessoria da Caixa não respondeu.
Procurada sobre o assunto do sistema de voluntarismo para o trabalho no sábado, a assessoria da Caixa ainda não deu resposta.
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