Diferença salarial entre homens e mulheres cai em São Paulo. Devemos comemorar?
Mulheres ainda trabalham mais e ganham menos que homens, diz OIT; igualdade de remuneração só será atingida em 2086
No final de fevereiro, a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) divulgou dados da mulher no mercado de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo em 2015. Um dos pontos abordados foi a diferença dos rendimentos por hora entre os sexos no ano passado, e foi constatado que a mulher a reduziu em 2,5 pontos percentuais: atualmente a força de trabalho feminina recebe 84% do salário pago aos homens.
O mercado de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo é melhor do que a média nacional, com um percentual de 55% de mulheres inseridas no mercado remunerado, contra os 46% nacionais. Isso se deve a causas diversas como estrutura produtiva e ocupacional melhor, mais oportunidades, além da questão cultural.
Podemos, a princípio, entender como um dado positivo, certo? Porém, segundo o coordenador da pesquisa, o economista Alexandre Loloian, é preciso cautela na hora de celebrar, uma vez que a causa para isso pode ser o abalo da crise econômica, maior entre homens do que entre mulheres.
“Há aproximações de números, como no contingente de desempregados, que foi de quase 50% mulheres e 50% homens; historicamente, as mulheres sempre foram maior alvo do desemprego. Agora, ficou mais próximo, assim como o rendimento médio. No entanto, não foram por causas virtuosas, pois 2015 foi um ano de crise, que atingiu mais homens que mulheres. Ou seja, foi porque homens tiveram piora na situação que elas chegaram mais próximo”, explica o economista.
A aproximação de salários também se deve pelo impacto negativo da crise econômica nos setores de Construção e Indústria da Transformação - que têm a maioria de funcionários homens.
Números que ajudam a ilustrar essa realidade desigual são vistos no rendimento médio real por hora. Entre as mulheres houve redução de 6,0% (R$ 10,25), interrompendo crescimento registrado nos últimos seis anos, enquanto que para os homens a retração foi ainda mais intensa, de -8,8%, passando a remunerar R$ 12,20 por hora.
Igualdade só em 2086
Está claro que a questão de igualdade entre gêneros é ponto urgente na agenda de entidades e governos (ou deveria ser!) em plenos 2016. Um dos exemplos é o Movimento ElesPorElas (HeForShe) de Solidariedade da ONU Mulheres pela Igualdade de Gênero, lançado em setembro de 2014. Evidentemente, qualquer conquista nesse sentido é louvável.
Questões sociais e culturais que envolvem preconceito e machismo vêm sendo discutidas por movimentos feministas por décadas – ganhando visibilidade com a ajuda de redes sociais – e, pelo que tudo indica, causando efeitos positivos. Apesar disso, ainda encontramos um cenário de marginalização feminina no mercado de trabalho, com números que assustam: do total da População Economicamente Ativa (PEA), elas ainda são minoria, 46%, e a diferença salarial no País chega a quase 20% entre mulheres e homens que cumprem o mesmo cargo.
Para ilustrar a urgência do tema, podemos destacar que o Brasil foi considerado o segundo pior entre os Países quando o assunto é a igualdade salarial entre os gêneros, de acordo com uma pesquisa que integra o Índice Global de Desigualdade de Gênero, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial em novembro de 2015. E se engana quem pensa que a disparidade só acontece nos chamados “setores tipicamente masculinos”: mesmo costureiras ganham, em média, 5,5% a menos que homens que exercem a mesma função, de acordo com uma pesquisa da Employer, empresa especializada em RH.
No ranking das profissões mais procuradas por mulheres brasileiras, ainda segundo a pesquisa, estão de Auxiliar Administrativo, Vendedor, Operador de Caixa, Recepcionista e Atendente. Em todas, elas têm salários menores que eles: -7%, -13,8%, -6,1%, -7,2% e -6,9%, nesta ordem. O maior índice de desigualdade, porém, foi registrado entre professores, com homens ganhando 19,6% mais do que mulheres.
Como explicar essa discrepância nos números? A responsável pelo Salário da Employer, serviço focado em cargos e remuneração, Fabiana Zandroski, explica que, além das questões histórico-sociais de preconceito, ainda existem entraves na contratação de mulheres pela licença maternidade. “Enquanto a licença maternidade é de 4 meses, para o homem é de 5 dias. Isso faz com que a responsabilidade pelo bebê caia na mulher, o que não é verdade. São questões que parecem bobas, mas que influenciam. Então, as empresas acabam contratando homens”, ressalva.
Outro fator importante é comportamental: os homens reivindicam mais frequentemente por melhores salários. As mulheres tendem a evitar conflitos e, por isso, reclamam menos este direito.
Porém, Fabiana é otimista e considera que há um movimento importante hoje de muitas empresas que buscam políticas para a igualdade, ou seja, maior conscientização. “Quando a empresa tem uma política bem estabelecida, ganha nas questões de rotatividade, competitividade. A igualdade de mercado é necessária e as corporações têm muita responsabilidade sobre isso”, defende.
Embora o mercado brasileiro apresente números desafiadores, o problema é mundial: segundo dados da ONU Mulheres, entre as 500 maiores empresas do mundo, menos de 5% possuem CEOs do sexo feminino. Além disso, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) afirmou que as mulheres trabalham mais e ganham menos que os homens – e que a igualdade de remuneração entre gêneros só será atingida em 2086. Com isso, percebemos um cenário que ainda exige mudanças e quebras de paradigmas no mercado de trabalho global.
Passos lentos, porém reais
Olhando de maneira mais otimista, apesar dos dados que revelam um vão entre a presença masculina – que tem cargos mais altos, com salários maiores – e a feminina, a luta pelo empoderamento das mulheres no mercado já surtiu efeito em um horizonte mais longo.
Segundo estudos sociais do IBGE, de 2004 a 2014, houve um aumento de 60% no número de mulheres ocupadas em trabalhos formais, o que revela a melhoria na qualidade de emprego. Também nesta pesquisa, o instituto mostra que o crescimento das mulheres entre a População em Idade Ativa (PIA) foi de 20,1%, maior do que a de homens – o que pode ser interpretado pela maior saída masculina do mercado (a população de homens inativos variou em 42,1% - o dobro entre elas).
O economista Alexandre Loloian também aponta números que mostram a maior importância feminina no mercado a partir da década de 1990. “Temos muito o que melhorar, mas temos um patamar elevado se compararmos com estatísticas de outros países, estamos próximos da faixa de participação feminina em países desenvolvidos como a Inglaterra – e muito acima da Itália, por exemplo, com uma taxa de 37%”, destaca. “Isso mostra uma sofisticação do mercado brasileiro, o rompimento das barreiras culturais e o esforço individual e coletivo na busca pela educação”, finaliza.