As dificuldades da Petrobras para vender seus negócios na Argentina
Em meio a crise econômica e queda no preço do petróleo, empresa tenta se desfazer de seus ativos argentinos há dois anos, mas nada foi concretizado até agora
Definitivamente, o cenário não está nada favorável para a Petrobras. E não é só no Brasil: há mais de dois anos a estatal tenta se desfazer de seus negócios na Argentina, sem sucesso até agora.
Interlocutores envolvidos no processo, analistas e assessores empresariais ouvidos pela BBC Brasil apontam quatro fatores como determinantes para a dificuldade em concluir a venda: o ambiente político e econômico brasileiro, as investigações da operação Lava Jato, que desmontou um esquema bilionário de corrupção na companhia, a diversidade dos ativos no país vizinho e a queda no preço internacional do petróleo.
A gama de negócios da Petrobras na Argentina é ampla – inclui exploração de petróleo e de gás, área petroquímica, geração de eletricidade e postos de gasolina, entre outros itens. Uma pessoa ligada à negociação, que conversou com a reportagem sob a condição de anonimato, disse que essa "diversidade" é o ponto mais complexo da operação.
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Outro complicador, afirmou, é que a Petrobras espera vender o "pacote" de ativos para um só comprador, expectativa que talvez precise ser revista diante das dificuldades atuais.
O efeito do preço do petróleo na transação divide opiniões, já que a Argentina tem um sistema próprio de preços – herança dos governos de Néstor e Cristina Kirchner (2003-2015) – que, na prática, deixa o custo hoje cerca de 60% mais alto no mercado local do que no internacional.
Porém, segundo o analista econômico Mariano Lamothe, da consultoria Abeceb, é esperado que a distorção seja eliminada pelo governo Mauricio Macri, o que faria o preço local passar a obedecer a lógica do mercado.
Lamothe é um dos especialistas que veem na variação no preço da commodity um dos motivos que complicam a venda. "A volatilidade do mercado petrolífero, com a queda no preço do barril (que há cerca de dois anos era cotado a US$ 110, mas hoje está na casa dos US$ 30), deixou o setor menos atrativo para o investidor."
Por isso, disse ele, o momento atual pode não ser o ideal para a venda. O problema, lembrou, é que a Petrobras já expressou precisar de caixa – ou seja, talvez não possa esperar pelo cenário ideal para fechar o negócio.
Potencial compradora
Publicamente, a única candidata à compra da Petrobras Argentina é a empresa Pampa Energía, que atua principalmente no setor de energia elétrica. Segundo a imprensa local, a companhia teria oferecido US$ 1,2 bilhão (R$ 4,69 bilhões) pelos ativos da estatal brasileira.
Interlocutores da Pampa, que pediram para não serem identificados, não confirmaram a cifra, mas disseram já esperar, desde o início, que não se trataria de uma negociação rápida.
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"Sabemos que o estilo da Petrobras não é de negociar e vender rapidamente. E ainda mais agora com o ambiente político e econômico do Brasil e o petrolão. Nossa oferta foi feita em dezembro e já sabíamos que a venda não seria concluída antes de março, pelo menos. Não é uma negociação simples", disse uma pessoa ligada à empresa argentina.
Caso a compra seja concretizada, a Pampa Energía passaria a ser a quarta maior companhia petrolífera do país, calculam esses interlocutores.
"A compra (da Petrobras Argentina) é complexa, mas estamos pensando em termos estratégicos. É importante para a Pampa ser parte decisiva na área de petróleo e gás", disse um deles.
A empresa é uma das principais geradoras e distribuidoras de energia elétrica da Argentina por intermédio da Edenor, que atende 2,8 milhões de clientes no país.
A Pampa e a Petrobras já são sócias, como acionistas, na TGS, do setor de gás natural, e tinham sociedade na Transener, maior companhia de transmissão de eletricidade da Argentina – vendida poucos anos atrás.
Esse negócio foi citado nas investigações da Lava Jato, segundo a imprensa dos dois países.
Propostas prévias
Em 2002, pouco depois da pior crise política e econômica vivida pela Argentina, a Petrobras adquiriu os ativos da Perez Companc, um dos maiores conglomerados do país vizinho à época, e se fortaleceu no mercado interno.
As primeiras informações de que a estatal brasileira se desfaria de seus negócios ali surgiram em 2013. À época, um empresário ligado ao kirchnerismo foi apontado como o principal candidato à compra.
Assessores da Petrobras no Brasil chegaram a confirmar extraoficialmente a negociação, mas o negócio acabou suspenso.
Em 2014, a companhia vendeu investimentos na província de Santa Cruz, incluindo campos de petróleo e de gás, para o grupo Corporación América.
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No ano passado, a estatal argentina YPF fez uma oferta de US$ 900 milhões (R$ 3,5 bilhões) pelos ativos da Petrobras (cerca de 63%, já que o restante é negociado em bolsa). Esse valor teria sido considerado baixo pela brasileira.
Procurada pela BBC Brasil, a YPF informou que não fez uma nova proposta. Especialistas, porém, afirmam ser difícil acreditar que a YPF tenha desistido da compra – até o ano passado, a empresa era a principal candidata.
Comunicado oficial
No último dia 20 de janeiro, a Petrobras informou oficialmente à Comissão de Valores Mobiliários brasileira ter iniciado "negociações" para venda de sua participação na Petrobras Argentina.
No mesmo texto, de poucas linhas, afirmou: "Até o momento, não há qualquer acordo firmado que confira segurança quanto à conclusão da transação, nem deliberação por parte da Diretoria Executiva ou do Conselho de Administração".
Segundo interlocutores do governo brasileiro, a empresa não descarta "continuar com as explorações do gás não convencional (xisto)" na região de Vaca Muerta, na Patagônia, apontada como uma das maiores reservas deste tipo no mundo.
Questionada pela reportagem sobre o assunto, a Petrobras respondeu apenas que só se manifestaria "sobre venda de ativos, em geral" por meio de comunicado ao mercado.