Minério de ferro: nova fórmula dá transparência
Para BHP Billiton, maior mineradora e rival da Vale, volatilidade nos preços poderá ser administrada no mercado financeiro
A mineradora anglo-australiana BHP Billiton, a maior do mundo e uma das principais rivais da brasileira Vale, comemora. O regime de contratos anuais para o reajuste do minério de ferro, a matéria-prima para produção de aço, parece ter chegado ao fim.
"Ambos os lados, tanto produtores como consumidores, podem usar esse mercado que é mais transparente para travar os preços de acordo com suas estratégias e perspectivas", afirma o executivo.
Nos últimos anos, a mineradora foi a maior defensora da nova modalidade de preços, que leva em consideração "as forças de mercado" - o equilíbrio entre oferta e demanda.
O regime antigo durou quatro décadas. Em negociações privadas, cada mineradora discutia com a siderúrgica o preço de venda do minério de ferro para vigorar por 12 meses - o valor definido servia de referência ("benchmark") para todas as outras vendas por parte das mineradoras.
Inicialmente, a Vale se opunha à ideia. Na visão de analistas, como o setor de mineração exige grandes investimentos para novos projetos, um fluxo de recursos constante e definido pelo preço do minério ajuda no planejamento das expansões de novas minas.
A fórmula de benchmark mostrou sua fraqueza quando veio a crise mundial no fim de 2008. Com a brutal queda nos preços do minério de ferro, parte das siderúrgicas, especialmente as chinesas, deixou de cumprir os contratos para adquirir a matéria-prima no mercado à vista a um preço mais baixo do acertado no contrato anual.
Com o esgotamento da fórmula antiga num momento em que a demanda da China volta a se recuperar e os preços no mercado a vista aumentam, as mineradoras estão agora dando o troco. Os primeiros contratos com o novo regime estão saindo ao preço de US$ 110 por tonelada, quase o dobro do que vigorou ao longo do ano passado.
Mas a Vale mudou de posição em relação ao benchmark, decretando o fim de sua fórmula. A tendência da mineradora brasileira é utilizar um sistema de reajuste mais flexível. Sua maior dificuldade, contudo, será convencer as siderúrgicas chinesas a aceitarem um valor que embuta o custo do frete - um valor significativo para o transporte de minério - que seja tão competitivo com o minério extraído da Austrália.
Para Alex Vanselow, o custo do frete, assim como a qualidade do minério de ferro, passa a ser um fator de diferenciação na negociação do minério de ferro.
Radicado há duas décadas na Austrália, Alex Vanselow, pouco conhecido do público brasileiro, está numa das posições mais destacadas para avaliar as mudanças que afetam a indústria mundial de mineração. A seguir a entrevista:
iG: O que acontece com o fim do sistema de benchmark depois de 40 anos? Quais as vantagens sobre o novo sistema de definição de preço tanto para as mineradoras como as siderúrgicas?
Alex Vanselow: Um bom exemplo é ver como funciona o mercado de cobre. O preço dele é decidido pelo mercado diariamente. Mas não é só o preço do dia, mas também o preço futuro. Ambos os lados, tanto produtores como consumidores, podem usar esse mercado que é mais transparente para travar os preços de acordo com suas estratégias e perspectivas.
iG: Analistas avaliam que o antigo preço trazia menos volatilidade ao fluxo de caixa das mineradoras. A mudança não pode criar incertezas em momentos de grande turbulência, afetando a capacidade de investimentos das empresas?
Vanselow: A volatilidade do preço pode ser medida e gerenciada. O grande risco para o produtor em tempos turbulentos é o consumidor do minério de ferro não cumprir com o contrato como aconteceu em dezembro de 2008. Isso não só afeta a receita da empresa como também a produção e seus custos. Os mecanismos de determinação de preço no mercado aberto são influenciados pelos custos do produtor marginal e os incentivos necessários para produtores reinvestirem.
iG: A falta de liquidez não pode comprometer o sucesso deste novo regime de preços?
Vanselow: O mercado para cada produto está em diferente fase de maturidade - o mais estabelecido é o de petróleo e o mais novo é o de minério de ferro. Se olhar a evolução do índice Global Coal (que mede a cotação do carvão térmico), você verá que a trajetória é bem rápida. Veja a manchete desta quarta-feira do jornal inglês Financial Times. (A reportagem mostra que o volume de contratos com derivativos em minério de ferro crescerá de US$ 300 milhões hoje para US$ 200 bilhões até 2020, segundo projeções.)
iG: As mineradoras mais próximas dos mercados emergentes, como a China, não saem em vantagem em relação às mineradoras mais distantes, como a Vale, do Brasil?
Vanselow: O frete é um item separado e tem o mercado próprio. Assim como a qualidade do produto, também é um fator de diferenciação.