61% das crianças e adolescentes brasileiras estão na pobreza, apontou Unicef
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61% das crianças e adolescentes brasileiras estão na pobreza, apontou Unicef

Trinta e dois milhões de crianças e adolescentes brasileiros são afetados de alguma forma pela pobreza. O índice alarmante que chega a 61% é a principal conclusão de um estudo divulgado nesta terça-feira (14) pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) com base na Pesquisa Nacional por Amostras de Domícilios (Pnad) realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2015.

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A pesquisa que levou em consideração os efeitos monetários (renda insuficiente), mas também a privação ao direito à educação, informação, moradia, saneamento básico e água potável, bem como o problema do trabalho infantil revelou ainda que as crianças e adolescentes negras são as mais prejudicadas na maioria dos quesitos.

A questão financeira, porém, seguiu sendo a mais problemática e delicada. De acordo com o levantamento, 18 dos 32 milhões são afetados pela pobreza monetária, o que representa 34,3% do total. Pelos critérios da Unicef, elas não têm renda suficiente para comprar uma cesta básica de itens fundamentais para sua sobrevivência.

Esse valor considerado mínimo diz respeito a uma renda per capita de no mínimo R$ 346,00 para a zona urbana e R$ 269,00 para a zona rural.

Mas apenas 11,2% (6 milhões) desses são afetados somente pela pobreza monterária e têm os demais seis direitos analisados garantidos. Enquanto isso, outros 23,1% (12 milhões), além da falta de dinheiro, têm um ou dois direitos negados, o que já caracteriza "privação múltipla" nas palavras do órgão internacional.

Além deles, o País têm ainda 14 milhões de crianças e adolescentes que, apesar de terem acesso a renda per capita superior aos R$ 346 na cidade ou R$ 269 no campo, por outros motivos, têm um ou mais direitos negados. O que as coloca na situação de pobreza da mesma forma.

Segundo a Unicef , somando esses dois grupos, são 27 milhões de crianças e adolescentes em situação de privação no País. Praticamente metade (48,7%) da população brasileira de até 17 anos.

Crianças e adolescentes com direitos negados

Saneamento básico é um dos direitos mais negados a crianças e adolescentes no País
Tiago Queiroz/AE
Saneamento básico é um dos direitos mais negados a crianças e adolescentes no País

Entre os seis direitos analisados pela Unicef, o direito ao saneamento é o mais negado às crianças e adolescentes brasileiros. No total, são 13,3 milhões privados do acesso a uma rede de esgoto de forma intermediária ou extrema.

Destes, 3,1% das crianças e adolescentes brasileiros sequer têm um vaso sanitário em casa. Outros 21,9% têm apenas fossas rudimentares ou latrinas. O retrato de um País que não oferece o mais essencial aqueles que estão na base da pirâmide etária. E o pior: entre aquelas que tem acesso negado a esse direito básico de alguma forma, 70% são negras.

A situação é ainda mais grava nas regiões Norte e Nordeste, notadamente mais pobres do País, onde 44,6% e 39,4% enfrentam o problema, respectivamente.

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Enquanto isso, o segundo direito mais privado aos pequenos é ainda mais alarmante: acesso à educação. São 8,7 milhões de crianças e adolescentes que não têm condições de frequentar uma escola.

Nesse recorte, os negros também são mais penalizadoS. Segundo o estudo, há 545 mil meninas e meninos negros analfabetos no Brasil, enquanto os brancos são menos da metade: 207 mil, um índice, de qualquer forma, muito alto também. Dos brasileiros menores de 17 anos, 20,3% têm o direito à educação violado de alguma forma (estão atrasado ou são analfabetos), sendo que 6,5% estão fora da escola. 

No critério de acesso à informação, 25,7% das crianças e adolescentes não tiveram conexão com a internet nos três meses anteriores à coleta da Pnad. 73% são negros.

No que diz respeito à privação de água potável, 6,8% dos brasileiros de 0 a 17 anos não contam com sistema de água em casa, enquanto 7,5% não tem água filtrada ou procedente de fonte segura como poços artesianos ou rios despoluídos. O problema se agrava na região norte do País e na zona rural.

Enquanto isso, 11% das crianças e adolescentes não tem uma casa no Brasil. Destes, 6,8% vivem em barracos de madeira com quatro pessoas por quarto e 4,2% moram em barracos com teto de palha e cinco pessoas por quarto.

Por último, o trabalho infantil doméstico ou remunerado atinge 6,2% dos menores brasileiros. Uma atividade que, além de privar muitos do acesso a outros direitos como o da educação, é ilegal para menores de 13 anos. Mesmo assim, 3% das crianças de 5 a 9 anos e 7,4% das que têm entre 10 e 13 anos trabalham. Já entre os maiores de 14 anos, 8,4% (quase 1,2 milhão) afirmaram que trabalham mais do que as 20 horas semanais permitidas por lei.

O número é tão alto que o judiciário brasileiro resolveu reconhecer o tempo trabalhado na infância e na adolescência no tempo de contribuição dessas pessoas ao INSS.

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Na ocasião, a desembargadora federal Salise Monteiro Sanchotene, afirmou que a adoção de idade mínima – atualmente em 16 anos - configura dupla punição, já que além de ser vítima de trabalho infantil, o tempo de prestação de serviço não é computado pelo INSS.

De acordo com a magistrada, inúmeras crianças são levadas ao trabalho por seus próprios pais para auxiliarem no sustento da família:

“Não há como deixar de considerar os dados oficiais que informam existir uma gama expressiva de pessoas que, apesar de se enquadrarem como segurados obrigatórios, possuem idade inferior àquela prevista constitucionalmente e não têm a respectiva proteção previdenciária”, comparou com os trabalhadores com mais de 16 anos.

Ela ainda ressaltou que os programas dedicados a erradicar o trabalho infantil são insuficientes, já que estudos e ações fiscalizatórias governamentais atestam a existência de serviços feitos por crianças com menos de 12 anos nos meios rural e urbano.

Salise Monteiro Sanchotene disse também que essas pessoas, que tiveram a infância ceifada devem merecer a proteção previdenciária não só para a futura aposentadoria, mas também para ter acesso a outros benefícios proporcionados pelo órgão público.

Entenda a classificação da Unicef

Unicef têm critérios objetivos para classificar situação de crianças e adolescentes em relação a cada um dos direitos considerados fundamentais
UNICEF/UN076876/Chute
Unicef têm critérios objetivos para classificar situação de crianças e adolescentes em relação a cada um dos direitos considerados fundamentais


  • Educação

Privação intermediária: criança de 7 a 17 anos que frequenta a escola, mas com atraso, ou maior de 7 anos analfabeta que frequenta escola.

Privação extrema: criança de 4 a 17 anos que não frequenta escola ou criança ou maior de 7 anos analfabeta que não frequenta escola.

  • Informação

Privação intermediária:  criança de 10 a 17 anos que não teve acesso à internet nos últimos 3 meses, mas tem TV em casa.

Privação extrema: criança de 10 a 17 anos que não acessou a internet nos últimos 3 meses e não tem TV.

  • Moradia

Privação intermediária: menor de 18 anos que vive em casa com 4 pessoas por dormitório ou cujas paredes e te%to são de madeira aproveitada.

Privação extrema: menor de 18 anos que com mais de 4 pessoas por dormitório ou cujas paredes e teto são de palha.

  • Água

Privação intermediária: menor de 18 anos que vivem em casa com água, que vem de poço sem filtro ou fonte desconhecida.

Privação extrema: menor de 18 anos que vive em casa sem água.

  • Saneamento básico

Privação intermediária: menor de 18 anos que vive em casa com banheiro compartilhado ou fossa rudimentar.

Privação extrema: menor de 18 anos que vive em casa sem banheiro ou com vala a céu aberto.

  • Trabalho infantil

Privação intermediária: criança de 5 a 9 anos que fez de 10 a 20 horas de tarefas domésticas na semana; criança de 10 a 13 anos que fez entre 15 e 20 horas; e criança de 14 a 17 anos que fez entre 21 e 30 horas na semana.

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Privação extrema: criança de 5 a 9 anos que trabalhou ou fez mais de 20 horas de tarefas domésticas na semana; criança de 10 a 13 anos que trabalhou por mais de 14 horas ou fez mais de 20 horas de tarefas domésticas na semana; crianças e adolescente de 14 a 17 anos que trabalhou por mais de 30 horas ou realizou mais de 30 horas de tarefas na semana.

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