De acordo com um levantamento realizado pela consultoria Data Popular em 2015, o aumento de negócios fomentados nas favelas é de extrema importância para a macroeconomia , uma vez que mais de 12,5 milhões de pessoas residem nessas áreas. Para se ter uma ideia da dimensão, se as comunidades formassem um estado, este seria o quinto maior do País, ultrapassando o Rio Grande do Sul em números de habitantes. Atualmente, grandes empresas e iniciativas atuam diretamente nas favelas, ajudando na expansão do empreendedorismo e na concretização de projetos dos próprios moradores.

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Com o reconhecimento do potencial empreendedor dos habitantes de comunidades, diferentes iniciativas voltadas ao empreendedorismo começaram a surgir em todo o Brasil, a fim de potencializar o aprimoramento de conteúdos e ajudá-los financeiramente, como fazem os projetos Favela Holding, no Rio de Janeiro e o Empreende Aí, aqui em São Paulo.

Favela Holding

Cufa Card, criado pela Favela Holding e CUFA incentiva o empreendedorismo e o controle das finanças
Reprodução/Favela Holding
Cufa Card, criado pela Favela Holding e CUFA incentiva o empreendedorismo e o controle das finanças

A Favela Holding ( FHolding ) é um conjunto de empresas que têm como intuito o desenvolvimento das favelas e de seus moradores. Com apenas quatro anos de criação, a FHolding  atua junto a empreendedores comunitários, para a promoção de novas oportunidades empregatícias.  A iniciativa partiu do ex-coordenador da Central Única de Favelas (CUFA), Celso Athayde, que identificou a necessidade de uma mudança na matriz econômica da comunidade, que se baseia, em sua maioria, em uma economia informal e paralela.

O projeto busca gerar parcerias entre empresários de diferentes segmentos, que pretendem investir em favelas cariocas e que apostam no potencial dos novos empreendedores, os transformando em potenciais sócios.

“No total somos 21 empresas. Todos os nossos colaboradores moram em favelas. Os moradores são sócios de muitos dos nossos negócios. Nós causamos impacto na base da pirâmide. Seja na empregabilidade ou no meio empreendedor. Vivemos num País capitalista, não adianta falar de ações sociais sem falar em ganhar dinheiro.  Essa sempre foi a nossa pauta, fazer os jovens das favelas se envolverem com negócios e sobreviverem deles.”, afirma Athayde.

Junto com a CUFA, a Favela Holding desenvolveu o Cufa Card - uma empresa de negócios financeiros sociais, que tem como carro chefe um cartão social, customizado para as favelas.

“Cerca de 50% dos moradores não tem conta em banco. Então criamos um cartão que ele não precisa comprovar renda para ter. Não tem consulta no Serasa e não contrai dívidas por ser pré-pago. O fato é que fizemos uma grande pesquisa e descobrimos que os moradores das favelas gastam R$ 50 por mês em crédito de celular, sendo que 87% deles tem celular pré-pago. Com isso, construímos um modelo em que o morador quando quer usar o cartão paga R$ 8 e recebe R$10 em crédito, na prática ele recebe para usar”, explica.

Entre os beneficiados do cartão está Ingrid Souza, a primeira usuária do Cufa Card. Para ela, a principal vantagem foi parar com as dívidas causadas pelos juros e taxas abusivas do banco. Ingrid também afirma que a adesão do recurso impactou diretamente sua autoestima, uma vez que pode se sentir no controle de suas finanças.

“Melhorou minha autoestima, pois eu havia parado de usar cartões por conta de taxas e juros. Depois que eu não pude mais comprovar minha renda, passei algumas situações desconfortáveis ao tentar fazer um novo cartão. Com o Cufa Card, pude me sentir parte da sociedade geradora de investimentos e produtos. Pude me sentir uma mulher poderosa”, conta.

O empreendedor Mário Sérgio de Souza comenta que aderir o cartão o ajudou pela não cobrança de encargos, taxas e aluguel. Também com a ajuda da CUFA, Souza abriu a academia de atividade física, Wifitness. Para ele, o nicho de oportunidade foi tentar provocar uma mudança na rotina de um público alvo que buscava os mesmos serviços em grandes centros. Com isso, procurou criar um ambiente agradável e de alta capacidade técnica, com tiquete médio acessível aos moradores.

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“O projeto devolve aquilo que sempre almejamos enquanto moradores ou pertencentes de favelas: dignidade e resiliência. Fazemos isso em meio ao caos do desnível de renda, com falta de incentivo e com um panorama político social totalmente adverso. É por isso que projetos assim são importantes. Eles trazem conteúdo e aprendizado junto com a oportunidade de empreender”, ressalta Mário.

Dentro da Favela Holding há também a iniciativa Favela Vai Voando (FVV), onde os moradores das periferias entram com o ponto de venda, que pode ser suas próprias casas enquanto a FHolding entra com o investimento. As vendas de passagens aéreas são programadas e parceladas em até 13 vezes. Segundo Celso Athayde, esse é um mercado em expansão, onde a sustentabilidade está na relação dos sócios com os moradores.

Empreende Aí

Uma das turmas do Curso Despertando o Empreendedor
Reprodução/Empreende Aí
Uma das turmas do Curso Despertando o Empreendedor

O administrador de empresas Luis Coelho e a psicóloga Jennifer Rodrigues criaram o Empreende Aí em 2015, com a vontade de ajudar empreendedores de territórios populares a gerarem seus próprios negócios. A ideia de criar o projeto que fornece cursos presenciais e online surgiu depois de participaram de uma palestra de Muhhamad Yunus  – um dos responsáveis pelo crescimento do desenvolvimento econômico de Bangladesh – que os inspiraram a fundar algo que tivesse um maior impacto no território onde moram,  na zona Sul de São Paulo.

“Somos de territórios populares e percebemos que as empresas que trabalham com educação empreendedora não possuem linguagem adequada para trabalhar com o empreendedor da periferia. O Empreende Aí nasceu como um blog, e somente em 2015 tornou-se um negócio de impacto. De lá para cá o negócio vem mudando, principalmente para conseguir atender a crescente demanda por nossos cursos, e devido a isso lançamos o nosso curso online”, afirma Jennifer Rodrigues.

De acordo com Jennifer, os sócios não investiram dinheiro diretamente no projeto, mas captaram recursos por meio de editais e contratações de algumas empresas para ajudar mais de 200 empreendedores nos últimos dois anos, além do auxílio em mais de 80 negócios.

Outro ponto levantado pela psicóloga é a mudança nas formas de trazerem oportunidades de apoio financeiro e acesso a novos clientes para os produtos e serviços desses empreendedores. No final do segundo semestre do ano passado, o projeto contou com um canal de financiamento para ajudar seis participantes a levantarem recursos para seus negócios e torná-los conhecidos. No momento, não há campanhas no ar.

Entre os cases de sucesso está o de Mariana Rosa e Levi Levi, um casal que vive no extremo sul de São Paulo. Eles fizeram parte da sétima turma do curso Despertando o Empreendedor e decidiram abrir um salão de beleza, juntamente da então sócia, Sara Leediane.   O estabelecimento nomeado Espaço Boom Box fica no Grajaú e tem como principal objetivo tratar da estética negra, com penteados, cortes e um ambiente voltado para esse público. Segundo Luis Coelho, o salão foi muito bem recebido pelos moradores, oferecendo pocket shows de artistas locais e discussões sobre questões raciais.  

Josiane Macedo também potencializou sua veia empreendedora com o curso. Atualmente ela é fundadora do Josi Chocoligth, negócio do ramo alimentício voltado para festas e coffee breaks . Por meio de uma indicação do Empreende Aí com o Afrobusiness, – iniciativa que tem como objetivo  trazer oportunidades de trabalhos para a população negra – Josiane fechou uma parceria com uma grande rede de hotéis, a qual fornece seus produtos.

 “Acreditamos que além do curso de empreendedorismo, os novos gestores precisam de acesso ao mercado e a novos clientes para desenvolverem seus negócios. Vamos continuar ajudando aqueles que sonham com o negócio próprio levando este conhecimento adiante, de forma que toda a sociedade possa sair ganhando com empreendedores capacitados e uma economia mais sólida”, conclui Coelho.

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